domingo, 21 de fevereiro de 2016

"Amor não tem nada a ver com idade" de Michelle Oliveratto da revista "Obvious" (2015)

O artigo da revista "Obvious", pode ser consultado aqui,
em http://obviousmag.org/infinito_particular/2015/amor-nao-tem-nada-a-ver-com-idade.html

Link geral da página em http://obviousmag.org/

Autoria de Michelle Oliveratto, aqui mais detalhes da autora
"José Saramago e Pilar Del Río dão um exemplo que a diferença de idade é irrelevante para as escolhas do coração. “Amor não é mais nem menos forte conforme as idades, o amor é uma possibilidade de uma vida inteira e, se acontece, há que recebê-lo. Normalmente, quem tem ideias que não vão neste sentido e, que tendem a menosprezar o amor como fator de realização total e pessoal, são aqueles que não tiveram o privilégio de vivê-lo, aqueles a quem não aconteceu esse mistério."


“Ela nasceu em 1950 e eu em 1922. Tenho uma sensação esquisita quando penso que houve um tempo em que eu já estava aqui e ela não. É estranho pra mim entender que foi preciso passar 28 anos desde o meu nascimento para que chegasse a pessoa que seria imprescindível em minha vida... 

Quando a conheci, eu tinha 63 anos, era um homem já velho. Ela tinha 36 anos. Os amigos me diziam: “Isso é uma loucura, um disparate! Com essa diferença de idade.” E eu sabia, mas não me incomodava. Agora não posso conceber nada se Pilar não existisse. Quando ela não está, a casa se apaga. E quando volta, se reativa”


"Se o amor é essa “coisa” que transcende a questão do tempo cronológico. Que transpõe barreiras, dificuldades e preconceito, onde a prioridade é cuidar do outro, querer o bem do outro e, o fato de estar junto se torna maior do que qualquer outra coisa. E se imaginar longe daquela pessoa é algo inadmissível.

Se o amor é aquele sentimento que contraria o castigo dado por Zeus e todos os deuses e, você vai de encontro com a sua alma gémea, que outrora estava perdida. Independente dos olhares, dedos apontados e criticas, porque sua forma de amar vai contra ao “protocolo” de socialmente aceitável.

Quando movido pelo amor, a permanência deixa de ser escolha e se torna necessidade. Porque viver sem aquela pessoa é possível, porém é inimaginável a ausência daquela presença tão especial, que a vida te preparou por 15, 20 ou 28 anos para sua chegada.

Quando a singularidade se torna plural. Quando a presença se torna luz. Quando as mãos se entrelaçam feito namorados, mesmo depois de mais de vinte anos de união. Quando um toca o rosto do outro com tanta delicadeza, que as pontas dos dedos são capazes de redigir poemas na face.
Quando os olhares se cruzam e neles é possível ver sentimentos que palavra nenhuma traduz. Não por limitação humana, mas porque o amor é santo demais, puro demais para ser traduzido com exatidão por signos linguísticos.

Assim que vejo o amor entre José Saramago e Pilar. Escritor que ultrapassou a sensibilidade demonstrada em suas inúmeras obras e, trouxe para sua vida real. Dando um testemunho de uma história de cumplicidade, amor, companheirismo, devoção e afeição, vivido ao lado de Pilar, que foi retratada em suas obras, depoimentos e até mesmo no documentário: “José e Pilar” de Miguel Gonçalves Mendes. Impossível ver o amor dos dois e não se apaixonar também.
Saramago conheceu Pilar quando tinha 63 anos e, afirma que se tivesse morrido nessa idade, antes de conhecê-la, morreria muito mais velho do que quando realmente chegasse sua hora. A chegada de Pilar em sua vida, fez com que ele ganhasse uma nova vida. Já Pilar, afirma que ao conhecê-lo, sabia que seria para sempre."


"O homem que tinha ideias para romances se uniu com a mulher que tinha ideias para vida, desconhece a linha tênue que separa qual das duas coisas que são mais importantes, optou por simplesmente viver a junção que ambas proporcionam.

Muitos olham para os dois e vê uma mulher jovem que se casou com um homem mais velho, por inúmeros outros motivos, menos amor. Já outros, conseguem ver sem as lentes do preconceito e nota que amor, ou qualquer outro sentimento, não tem nada a ver com idade.

Como Saramago mesmo cita: “Isso é uma ideia que ofende a disponibilidade de entrega de uma pessoa a outra, que é em que consiste o amor... Amor não é mais nem menos forte conforme as idades, o amor é uma possibilidade de uma vida inteira, e se acontece, há que recebê-lo. Normalmente, quem tem ideias que não vão neste sentido, e que tendem a menosprezar o amor como fator de realização total e pessoal, são aqueles que não tiveram o privilégio de vivê-lo, aqueles a quem não aconteceu esse mistério.”

Acho um desperdício criar empecilho para o amor. É um fato que dificuldades existem. Nadar conforme a maré exige muito menos sacrifício, mas quem nos prometeu que a vida seria fácil? Estipular idade para relacionamento, como quem define censura indicada para filme é duvidar da capacidade de viver um sentimento tão pleno e raro.

A vida a dois já tem dificuldades suficientes para deixar que interferências externas dite sua forma de amar. Preconceito existe, ilusão seria negar esse fato. Mas a vida é tão rara e breve para fechar a porta na cara do amor só porque o tempo é relativo e para os sentimentos não há regras, não escolhe cor, sexo, idade ou momento certo para aparecer e, querer controlar, isso sim é ilusão e perda de tempo. Certas coisas aparecem simplesmente para serem vividas, desfrutadas e agradecidas.

Saramago e Pilar são um exemplo de coragem, amor que virou filme, livro, nome de rua e um testemunho que sim, não há limites para amar, basta querer e se permitir.

Não me surpreenderia saber que a pedra do jardim vive florida. Assim como essa história de amor e obra deixada por José Saramago floresce em nós."

© obvious: http://obviousmag.org/infinito_particular/2015/amor-nao-tem-nada-a-ver-com-idade.html#ixzz40owa6xVJ 
Follow us: @obvious on Twitter | obviousmagazine on Facebook




Sobre o livro de Bernard Connoly e os ventos políticos que pairavam pela Europa de 1995 - "Cadernos de Lanzarote Diário III" (5/9/1995)

A referida edição encontra-se à venda e disponível, aqui

"The Brussels Commission has just suspended its senior economist, Bernard Connolly, for writing a book savaging the prospects for a common currency. 
There are many who now believe he should be lauded as a prophet." 
Observer, Editorial, 1 October 1995

"Mr. Connolly's longstanding proposition that the foisting of a common currency upon so many disparate nations would end in ruin is getting a much wider hearing..." 
New York Times, 17 November 2011


5 de Setembro (de 1995)

"Dentro de poucos dias será publicado em Inglaterra um livro explosivamente polémico, se a fazenda de dentro vier a corresponder à amostra de fora, isto é, ao título anunciado: O Carcomido Coração da Europa: a Guerra Suja pela Europa Monetária. O autor chama-se Bernard Connolly e faz parte do certamente qualificado grupo de altos funcionários que estão encarregados de gerir a política monetária da União Europeia. Presume-se, portanto, que seja alguém que sabe o que diz. E que diz ele? Diz, por exemplo, que o Sistema Monetário Europeu é uma «monstruosidade económica» e a união monetária um «perigoso logro». E vai mais longe: prenuncia que a união monetária levará a uma batalha aberta entre a França e a Alemanha para conseguir a hegemonia na União Europeia. A Comissão não gostou de vaticínios e opiniões tão contrários aos seus gostos e entregou o caso ao Comité de Disciplina. Ora, independentemente da substância e do mérito dos fundamentos objectivos que assistam ao funcionário rebelde (aliás, seguidor declarado de Margaret Thatcher) para ter formulado tão sombrios prognósticos (chega mesmo ao ponto de dizer que tais conflitos e contradições poderão vir a resultar numa guerra), aquilo que, a meu ver, deveria merecer toda a nossa atenção é a emergência cada vez mais exigente da questão em que toda a gente pensa, mas de que pouquíssimos têm a coragem de falar sem disfarces: a hegemonia sobre a Europa. Que a Alemanha se tenha tornado, por assim dizer, em candidato «natural» a essa hegemonia, é algo tão flagrante que parece já ter adquirido um estatuto de fatalidade inelutável; que a França comece a reagir desesperadamente à perspectiva de continuar, no quadro europeu, a ser o que é hoje, apenas o maior dos menores, e ver agravada a sua dependência política - tudo isto é mais um episódio do velho jogo chamado «quem-manda-na-Europa», a que, ingenuamente, alguns políticos «integracionistas» pensaram poder mudar as regras. E se, como dizia o Eduardo Guerra Carneiro dos antigos tempos, «isto anda tudo ligado», é caso para nos perguntarmos se as bombas atómicas que Paris vai fazer explodir no Pacífico não se destinam, afinal, a ser ouvidas em Bona." (...)

in, "Cadernos de Lanzarote Diário III"
Caminho, páginas 149 e 150 (5/9/1995)