Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

quarta-feira, 21 de março de 2018

"Abraço, Carinho, Saudade Dedicatórias para Saramago" por Ricardo Viel (revista Piauí, edição #88 de Janeiro de 2014)

O presento artigo pode ser recuperado e consultado aqui

"Abraço, Carinho, Saudade Dedicatórias para Saramago" 
por Ricardo Viel 
revista "Piauí" edição #88 de Janeiro de 2014



Ilustração: Andrés Sandoval (2013)

"Rubem Braga mandou um abraço num exemplar da Traição da Elegantes, autografado em 1983. O poeta Lêdo Ivo manifestou saudades ao presenteá-lo com A Morte do Brasil. Caetano Veloso, pelo sim e pelo não, anunciou um retrato “distorcido, mas sincero” de sua geração em Verdade Tropical. O econômico Chico Buarque manifestou apenas “carinho” na folha de rosto de Budapeste. José Sarney foi quem mais se derramou. “Ao Saramago, mestre da língua e da ficção, esta história de pescadores do Maranhão, onde não faltam marinheiros das Descobertas, que vagam por todos os mares com as lendas e os encantos do mundo português”, demorou-se em O Dono do Mar.

O visitante curioso – e bairrista – encontra as dedicatórias na seção brasileira da biblioteca que José Saramago, o único Nobel de Literatura da língua portuguesa, mandou construir na ilha espanhola de Lanzarote, onde morou de 1993 até morrer, em 2010. Se Jorge Luis Borges tinha razão e o paraíso for mesmo uma espécie de biblioteca, o ateu Saramago pôde em vida se gabar de ter erguido um aconchegante Éden com vista para o mar.

Levantado no terreno ao lado de sua casa, o edifício pintado de branco tem 100 metros quadrados e a altura de um prédio de dois andares. É cercado por um muro de pedras vulcânicas e enfeitado com uma oliveira portuguesa. Aqui estão guardados 15 mil livros de Saramago, parte da biblioteca que juntou ao longo da vida (milhares de outros volumes foram doados à fundação lisboeta que cuida de seu legado). Um grande feito para quem, como ele, é neto de camponeses analfabetos e só conseguiu comprar seu primeiro livro aos 18 anos.

A construção da biblioteca era um desejo antigo, que se tornou factível depois do Nobel de 985 mil dólares, em 1998. Antes, os livros do português e de sua mulher, a jornalista espanhola Pilar del Río, estiveram por décadas encaixotados no porão da casa. Quando precisavam fazer uma consulta, era mais fácil correr à livraria do que tentar encontrar o título desejado.

Embora houvesse dinheiro, terreno e disposição, a biblioteca demorou a ficar pronta por causa do boom imobiliário na Espanha no começo deste século. Era impossível conseguir pedreiros na ilha do arquipélago das Canárias, a cerca de 130 quilômetros da costa da África e a mil da Península Ibérica. Só em 2006 o prédio ficou pronto.

O processo de catalogação do acervo durou dois anos mais. Os livros estão organizados a partir de critérios definidos por Saramago e Pilar. Ensaio, filosofia, religião, história, jornalismo, política e fotografia têm suas próprias seções. Romance, poesia e conto estão separados por países ou região. Por imposição de Pilar, escritoras ganharam suas próprias estantes para não dividirem espaço com aqueles que não as consideravam suas iguais. “Contra a vontade do Saramago, nesta biblioteca as mulheres estão separadas: são únicas, admiráveis, levadas em conta e queridas”, decretou.

No paraíso do autor do Evangelho Segundo Jesus Cristo e do Ensaio Sobre a Cegueira, há muitos livros sobre religião e ensaios. “Ele comprava muito mais ensaio que romance”, contou Norberto Ruiz Gallego, o livreiro local do escritor. Gallego, o primeiro a abrir uma livraria na ilha de 140 mil habitantes, virou personagem dos Cadernos de Lanzarote, os diários de Saramago. “Finalmente uma livraria em Lanzarote. O livreiro é um homem novo que fala do seu trabalho com entusiasmo”, comemorou o português em 23 de abril de 1994.

“Lembro-me perfeitamente do dia em que ele veio aqui pela primeira vez. Estava com o Pepe, o cachorro, e de cabeça levantada entrou olhando tudo, como se quisesse se assegurar que isso aqui era mesmo uma livraria, não mais um desses lugares que fazem fotocópias, vendem cadernos, canetas e algum ou outro livro”, relatou Gallego. Saramago fez sessões de autógrafo na livraria El Puente, e, sem querer, virou garoto-propaganda do lugar. Logo depois do Nobel, foi fotografado na porta do estabelecimento falando em um pré-histórico telefone celular.

Na biblioteca de Saramago não há exemplares valiosos nem muito antigos. Em frente à mesa onde trabalhava, ficam três sofás de couro que usava para cochilos reparadores. Nas paredes, há retratos de referências literárias (Camões, Drummond e Fernando Pessoa). Sobre os móveis, fotos com amigos e parentes, bonequinhos de Pessoa e Jorge Amado, e uma coleção de miniaturas de elefantes – protagonista de A Viagem do Elefante.

Embora privada, a biblioteca é aberta ao público das dez da manhã às duas da tarde, exceto aos domingos. Com tempo e paciência, encontram-se nas estantes peças de um relicário afetivo. Afora um ou outro item incongruente que melhor caberia na coleção de um Ionesco – exemplo: um exame de sangue de Pilar do ano de 1998 (colesterol e açúcar controlados) –, das primeiras páginas dos livros o que salta mesmo à vista são as dezenas de dedicatórias.

Na seção feminina, mandaram suas saudações Nélida Piñon, Lya Luft e uma animada Bruna Lombardi (“pelo privilégio do encontro”). Os latino-americanos incluem Carlos Fuentes (“arquipélago de amizade”), Mario Vargas Llosa (“sem a pretensão de ensinar nada”), Ernesto Sabato (“com o amor de um irmão”), o nicaraguense Sergio Ramírez (“que tanto quer a José”) e Gabriel García Márquez (que se identifica como “outro que também escreve”). Numa página do romance De Amor e de Sombras, de Isabel Allende, ficou preservada uma declaração de amor de Pilar, em que ela celebra os 24 anos de “amizade e compreensão” entre os dois.

Na seção dos livros escritos por Saramago ou sobre ele, um exemplar em espanhol de Caim, seu último romance, aparece “cordialmente” firmado pelo autor em março de 2010. Era um agrado à família Barede Ramírez, que deixou o livro para ser autografado e nunca passou para recuperá-lo. Foi uma das últimas dedicatórias que Saramago escreveu.

Ricardo Viel"

"Saramago aún vive en sus lectores" Relato da exposição Mairena del Aljarafe (17/11/2017) e a famosa visita ao "Colegio Aljarafe" em 2003

Aqui http://sevilla.abc.es/provincia/aljarafe/sevi-saramago-vive-lectores-201711162310_noticia.html

"Saramago aún vive en sus lectores
Mairena del Aljarafe acoge este fin de semana un encuentro dedicado al escritor portugués"

"Una de las exposiciones centradas en el escritor"

"Visita de José Saramago al Colegio Aljarafe en 2003"

"Mairena del Aljarafe acogerá este fin de semana el «II Encuentro Ibérico de lectores de Saramago» que reunirá a amantes de las letras y de la obra del afamado escritor portugués, premio Nobel de literatura y fallecido en 2010.

«Queremos unir a través de la literatura, creemos que en estos tiempos convulsos es muy importante el papel de compromiso social que representaba Saramago y que sigue latente en sus obras», asegura Blanca de Pablos, delegada de Cultura, Educación y Universidad del municipio. Los protagonistas del amplio programa de actividades serán, como no podía ser de otra manera, los lectores, que acudirán desde toda España y Portugal para participar en el evento. «El año pasado se celebró en Beja, en Portugal, y desde ese momento Mairena mostró su compromiso para traerlo a Andalucía», explica la delegada municipal.

La coordinación del encuentro corre a cargo de la mairenera Biblioteca José Saramago, que ha invitado al resto de bibliotecas españolas que llevan el nombre del escritor portugués, seis en total, a participar en los actos previstos. Las actividades comenzarán este viernes con la recepción de los visitantes y la apertura de varias exposiciones. Dos de ellas, «Retratos de José Saramago» y «La flor más grande», estarán compuestas de obras realizadas por los alumnos del Colegio Aljarafe con motivo de la visita que el escritor hizo al centro en el año 2003.

La visita en 2003
Precisamente la visita a Mairena del Aljarafe en 2003 será uno de los puntos centrales del encuentro, ya que el viernes por la noche se proyectará un documental con el discurso que el escritor pronunció en el Colegio Aljarafe en aquella ocasión. «Hemos llamado a la proyección 'El Nobel que pudo ser de la paz', ya que Saramago habló en el Colegio Aljarafe de pacifismo y de bondad en un momento que era muy convulso socialmente», detalla Blanca de Pablos.

Además, ya el sábado, tendrá lugar una mesa redonda sobre «La balsa de piedra como metáfora del iberismo» en la que se hablará, según la delegada mairenera, «del profundo deseo que Saramago sentía por la unión de España y Portugal». Participarán Mercedes de Pablos, Juan José Téllez y Diego Mesa.

También se reflexionará sobre lo que tienen en común el califa Al Mu'támid y el escritor y se hará una especie de «hermanamiento cultural» a través de sus figuras. Y, uno de los puntos más importantes del fin de semana: varios lectores, entre los que se encuentran Fernando Iwasaki o Marta Carrasco, elegirán cuál es su texto preferido de Saramago, explicarán al público las razones y lo leerán. «Queremos unir a través de la literatura y compartir gustos y aspiraciones», insiste Blanca de Pablos.

El fin de semana se cerrará con una visita guiada por Ángel del Río sobre los rincones que José Saramago y Pilar del Río frecuentaron en Sevilla. La esposa del escritor finalmente no podrá asistir al encuentro pero, según asegura la delegada municipal, «estará presente en cada momento, al igual que Saramago».

Pilar del Río: “El mayor defecto de Saramago era una virtud, no transigir ante el poder, su honestidad” Entrevista de José Antequera a Pilar del Río (La Crónica del Pajarito, 29/10/2017)

A entrevista de José Antequera a Pilar del Río (La Crónica del Pajarito, 29/10/2017) pode ser recuperada e consultada, aqui

Pilar del Río: “El mayor defecto de Saramago era una virtud, 
no transigir ante el poder, su honestidad”

“Nunca he tenido miedo a ser engullida ni por el ser humano ni por el genio. Conviví con un ser humano de igual a igual, como no puede ser de otra manera en las relaciones de pareja”

"Pilar del Río, presidenta de la Fundación José Saramago
(Foto: Joao Lima/Expresso)"

"Todos los relojes siguen parados a las cuatro en punto de la tarde. Todos y cada uno de ellos. Como si se tratara de una de las asfixiantes y terroríficas alegorías noveladas del genial escritor portugués. A esa hora, justo a las cuatro en punto, se conocieron José y Pilar, y así han quedado las manecillas de los relojes que él coleccionaba, apuntando para siempre hacia ese norte amoroso que marcó la relación entre ambos. “Sí, es verdad, siguen marcando las cuatro de la tarde, cómo iba a interferir yo en un acto poético de esa magnitud”, asegura Pilar del Río (Castril, 1950). Hace ya siete años de aquel odioso 18 de junio en que la maquinaria biológica, el reloj cardiaco de José Saramago, dejó de funcionar. Siete años sin la voz luminosa de la humanidad, siete años huérfanos de Saramago. Desde que él nos dejó, el mundo parece un lugar mucho más negro y oscuro de lo que ya era. Cómo hemos podido seguir viviendo sin él. Hoy Pilar, su esposa, que no su viuda porque ella “muerde” cuando le cuelgan ese funesto cartel, sigue presidiendo en Lisboa la fundación que lleva el nombre del premio Nobel. “No, nunca he tenido miedo a ser engullida ni por el ser humano ni por el genio. Conviví con un ser humano de igual a igual, como no puede ser de otra manera en las relaciones de pareja. En cuanto a escritor e intelectual, lo admiré y admiro tal como hacen miles de personas en el mundo. Y trabajar en su obra es un privilegio, no una merma”. En sus conferencias y charlas por todo el mundo, la periodista y traductora no para de recitar páginas enteras de Saramago en una especie de ofrenda literaria póstuma tan hermosa como extenuante. Su voz es el instrumento que pone música a la letra inmortal del escritor. Un párrafo de una novela o un artículo de prensa aquí, una cita o un pensamiento allí… Para que no se nos olviden las verdades que nos dejó de puño y letra y que ya no queremos escuchar. Y así, mientras Pilar sigue hablándonos de Saramago, él se mantiene vivo en nuestra memoria.

¿Cómo fue el momento mágico? Quiero decir, ¿cómo conociste a José Saramago?
El momento mágico lo sitúo en la librería Repiso de Sevilla, un lunes por la tarde. En un estante del fondo a la izquierda vi un libro de un autor para mí desconocido que me llamó la atención por el título. Se trataba de Memorial del convento. Leí el primer párrafo, me quedé admirada, lo leí en voz alta para las amigas con las que estaba, a cada una le regalé el libro y me fui a casa para seguir leyendo. Eso ocurrió en 1986. Desde entonces no he parado de leer a José Saramago…

Tengo entendido que él decidió detener su colección de relojes a las cuatro en punto, como símbolo de amor hacia ti, ya que os conocisteis a esa hora. ¿Y así siguen los relojes, parados a esa hora?
Siguen marcando las cuatro de la tarde, cómo iba a interferir en un acto poético de esa magnitud…

De alguna manera te enamoraste de un hombre inmortal. ¿Tuviste miedo en algún momento a ser engullida por el genio, a quedar anulada como profesional o incluso como persona?
No, nunca he tenido miedo a ser engullida ni por el ser humano ni por el genio. Conviví con un ser humano de igual a igual, como no puede ser de otra manera en las relaciones de pareja. En cuanto a escritor e intelectual, lo admiré y admiro tal como hacen miles de personas en el mundo. Y trabajar en su obra es un privilegio, no una merma.

Pero renunciaste a buena parte de tu vida por él… ¿Qué te dio Saramago y qué te arrebató?
Dejé de trabajar en periodismo para dedicarme a otras actividades, simplemente. Y José Saramago me aportó lucidez, como a todos sus lectores, y además un idioma, el portugués, y una cultura de la que sabía muy poco y ahora conozco bastante mejor.

La literatura os unía de alguna manera, ¿compartíais gustos por los mismos autores o en eso seguíais caminos diferentes?
Unas veces sí, otras no. Él tenía una especial predilección por Kafka que yo no compartía. Tampoco él era tan perdido de amores por Joyce como lo soy yo, aunque claro que lo leía e incluso fuimos a Dublín a vivir un Bloomsday. Él leía mucha poesía, también ciencia ficción, yo seguía otros caminos.

Pero supongo que habría intercambios encendidos de opiniones, discusiones literarias (y de las otras más domésticas) como en cualquier otra pareja…
Muchas discusiones y muchas risas. Vivíamos en un estado permanente de libertad de expresión y de discusión como estrategia para no caer en el conformismo o en el lugar común. Es importante estimularse intelectualmente y nada mejor que el contraste de pareceres, nunca considerar que no merece la pena discutir: eso es falta de respeto y ahí, caer en la falta de respeto, es de miserables. Bendito sea el debate.

Como traductora y correctora de sus obras al español, ¿te dejaba él libertad para interpretar sus textos o era un jefe inflexible en ese aspecto?
Tener al autor cerca no da libertad a la hora de traducir, siempre le decía que si volviera a nacer querría traducir a un autor de un idioma lejano, el japonés, por ejemplo, y de cinco siglos atrás, para que no me preguntara por qué tomaba determinadas decisiones… Bromas aparte, él no interfería nunca, pero es verdad que yo tampoco me sentía como pez en el agua. He traducido en estado de emoción permanente y eso puede ser una sobrecarga para el lector.

¿Era un hombre con el que resultaba fácil convivir o al contrario tenía esas típicas manías de genio?
Era muy fácil convivir con José Saramago y no tenía esas manías que suelen tener otros escritores, al menos cuando los vemos representados en cine o son retratados… En ese aspecto carecía de aura o “romanticismo”: escribir era un trabajo que hacía con dedicación, cuidado y esmero y punto, sin dramas, ansiedades o angustias.

¿Cuál era su principal virtud?
La honestidad.

¿Y su defecto más notable?
Era una virtud: No transigir ante el poder. Es decir, la honestidad…

¿Con qué se entretenía cuando no estaba escribiendo? ¿Le gustaba el cine, la música, veía algo de televisión?
Adoraba el cine, veía televisión, se reunía con amigos, le encantaba que vinieran amigos a casa, a Lanzarote, se organizaban muchas cenas en nuestra cocina, que está preparada para convivir y para la tertulia. Un paraíso.

Compartiendo tantas cosas como vosotros imagino que también le servirías como fuente de inspiración, ¿cuántas novelas de Saramago están atravesadas por la sombra de Pilar del Río?
Lo que ocurre a lo largo de la vida, las personas que conocemos, las lecturas, los viajes, las distintas experiencias, todo influye en lo que somos y hacemos, pero nunca me convertiría en detective para ver qué hay de mí en la obra de José Saramago.

¿Cuál de todas sus obras sientes más tuya, más influenciada por ti?
No siento ninguna influenciada por mí, sé que desde La balsa de piedra escribió viviendo en compañía de alguien que aparentemente no formaba parte de su entorno: otro país, otro idioma, otra edad. Y esas circunstancias, todas ellas, no parece que fueran negativas, podemos decir viéndolo ahora en retrospectiva.

Los últimos años de su vida sufrió mucho a causa de una larga enfermedad y tú estuviste a su lado hasta el último momento. ¿Qué era lo que más te dolía de verlo así? 
Aunque te parezca duro lo que te voy a decir, no iba sufriendo, simplemente sabía, lo sabíamos los dos, que la naturaleza tiene leyes que son imbatibles. Lo bueno fue que nunca tuvo dolores, escribió hasta meses antes de morir, hizo la vida posible. Ninguno de los dos queríamos cosas imposibles, no perdimos el tiempo en lamentaciones, tratamos de ser eficaces ante la adversidad y punto. Vivimos los dos la vida y la muerte como decidimos hacerlo, sin dar cuentas ni explicaciones.

Pero estuvo escribiendo hasta el final, de hecho preparaba una última novela cuando le sorprendió la muerte. ¿Veremos algún día una nueva novela de Saramago o ya está todo publicado?
Ya está publicada: se titula Alabardas y es un portento de lucidez. Trata de la fabricación de armas, del negocio de las armas, pero no visto desde el fabricante que quiere ganar dinero y para eso se pone de acuerdo con el gobernante, a veces también con el traficante, para organizar guerras y poder seguir experimentando y fabricando armas nuevas de tal manera que unos amplíen beneficios económicos y otro áreas de poder. No, José Saramago dice algo más importante que esto de la fabricación y comercio, se fija en el honesto ciudadano que trabaja en la fábrica de armas y vota a quien le asegure que mantendrá su puesto de trabajo porque se seguirán creando zonas de conflicto en el mundo. Esta novela no fue acabada, pero no importa, el planteamiento está ahí, la reflexión y la historia. Es una novela imprescindible, tanto que a veces pienso que se trata de ocultar del panorama. La portada de Alabardas es un dibujo antibélico de Gunter Grass, que colaboró de esa manera –además del dibujo de la portada hay otros en el interior– con el proyecto del amigo ya muerto. También Roberto Saviano escribe en este libro último de José Saramago.

Hoy presides la Fundación José Saramago y luchas por los derechos humanos. ¿Hemos avanzando o retrocedido en los últimos años en la defensa de los valores humanistas?
Hoy sabemos que hay derechos, aunque no se cumplan. Hoy sabemos que no se puede presumir de tener esclavos aunque haya gente condenada a la esclavitud. En eso hemos avanzado, pero hemos retrocedido porque, disponiendo de tecnología para hacer más agradable la vida de muchos, permitimos que haya continentes enteros sufriendo las consecuencias del desarrollo de algunos. Tenemos derechos, sí, también tenemos deberes. En la Fundación trabajamos en esta segunda parte, los deberes, como si todo dependiera de nosotros. Es un mandato que asumimos a partir del discurso del Nobel.

Las novelas de Saramago son profundamente filosóficas, le gustaba provocar la reacción del lector tocando grandes temas existenciales. ¿Es ese el problema de la humanidad, nos hemos olvidado de la filosofía?
No sé si nos hemos olvidado o simplemente nos hemos dejado embrutecer. Gobernar a consumidores conformistas es mejor que tratar con seres libres, que discuten, reivindican, plantean exigencias, avanzan.

Y con las redes sociales nos hemos hecho quizá más egoístas y superficiales. ¿Qué pensaba Saramago del mundo virtual, de internet?
Los caminos, y las redes son caminos, no nos hacen mejores ni peores. Saramago usaba internet, escribió un blog que también luego se publicó en formato libro, los titulados Cuaderno de Saramago 1 y 2, se comunicaba con amigas y amigos de todo el mundo a través de email. Saramago nunca desistió de usar un medio que le facilitaba la vida. Lo entendía como un instrumento y sabía usarlo.

¿Qué hubiera dicho (o escrito) Saramago sobre esta oleada de terror suicida que se extiende por todo el mundo?
Nunca me permitiría el lujo de decir qué habría hecho o qué haría Saramago, sé lo que hizo y dijo. Escribió Ensayo sobre la ceguera primero y luego Ensayo sobre la lucidez. Creo que ahí está todo dicho, el terror suicida, sus causas lejanas, sus consecuencias atroces en los países y en las personas. En Caín reflexionó con amargura acerca del papel de las religiones, del factor Dios, en tantos conflictos de la historia de la humanidad.

El sistema económico que aplasta al hombre, la sociedad de consumo, la pérdida de identidad del individuo son grandes asuntos en la obra de Saramago. ¿Crees que hay esperanza para los que nada tienen o todo irá a peor?
Lo de tener confianza en el presente y en el futuro es asunto a decidir entre todos. Si queremos una sociedad de consumidores excluiremos a quienes no puedan consumir, en la esperanza de que no nos toque a nosotros. Si optamos por ser ciudadanos, tendremos que ser protagonistas de nuestro tiempo, pensar, intervenir, cuestionar, asumir responsabilidades… Eso da trabajo, pero también satisfacciones.

Porque además parece que los ciudadanos seguimos estando un tanto adormecidos…
Adormecidos nos quieren. Resignados, indiferentes o temerosos: ese es el plan. En nuestras manos está contradecir este proyecto.

¿Por qué ni siquiera un movimiento ciudadano tan brutal como el 15M ha conseguido esa revolución social tan necesaria?
Creo que el 15M consiguió mucho, cambió paradigmas en España. Ver la sociedad política de hoy y la de hace unos años es ver la diferencia que existe entre el día y la noche. Desde la jefatura de Estado a la gente en la calle han cambiado muchas cosas, hay representantes de la sociedad en ayuntamientos y parlamentos de manera que era impensable hace 10 años. Y a estos cambios se les tiene miedo: basta ver la inquina con la que los medios de comunicación tratan lo nuevo que ha surgido en España para entender que le teme, que piensan que si lo nuevo avanza con firmeza ellos van a perder privilegios que creían suyos. Se necesita tiempo para avanzar, pero este país salió con el 15M de cierta modorra y ahora está tratando de avanzar de acuerdo con criterios que son propios, intentando vencer las normas que imponen los “elegidos” de arriba. Costará, pero el pasado es pasado y hemos entrado en otra era.

Saramago siempre mostró un gran compromiso político y social con los más desfavorecidos. ¿Ha perdido la literatura de hoy ese compromiso?
En absoluto: la literatura no tiene por objetivo cambiar el mundo, sí llegar a los lectores y eso cada autor lo hace como considera conveniente. José Saramago decía que escribía para desasosegar. En estos momentos estoy leyendo El cuento de las criadas, de Margaret Atwood, que recomiendo vivamente. Hay muchos escritores contemporáneos que nos hacen más humanos y más grandes al leerlos, y esto es importante no solo para cada uno de nosotros, que lo es, también es importante para las sociedades.

¿Y el periodismo? Tampoco parece atravesar por su mejor momento…
Hay muchos medios que están intentado sobrevivir al poder de los grandes grupos hegemónicos,  a pensamiento –y verdad– únicos. La sociedad digital nos ayuda a lectores y a  profesionales en el intento de combatir las hegemonías del pasado. Como decía García Márquez, ahora podemos hacer periódicos –o radios, o televisión– desde el valor de contar, actuando como si esta profesión de verdad fuera la más bonita del mundo, sin necesidad de pasar por los filtros e intereses de los grandes grupos multimedia.

¿Le perjudicó a José su condición de comunista y ateo? ¿Fue un hándicap en su carrera literaria?
No, por favor. Para quienes eso fuera un impedimento es que ya estaban antes fuera del tiempo y del universo de la literatura.

La izquierda en España, y también en Europa, vive momentos de crisis. ¿A qué crees que es debido?
A que ha faltado reflexión. No a la izquierda política, que esa gestionaba, digo a la izquierda social, a la universidad como foro que lanza ideas, a los centros de cultura, a los profesionales… Creo que hubo una cierta retirada de los espacios públicos, que fueron de nuevo tomados por la tradición y los grupos conservadores, de modo que llegó un día en que la izquierda progresista y libre se encontró sin lugar, perpleja, preguntándose cómo ha sucedido esto. La izquierda se tiene que reconstruir desde la ideas y también desde las movilizaciones. Los seres humanos somos razón y conciencia, que no se nos olvide.

Has decidido nacionalizarte portuguesa, ¿qué te empujó a hacerlo? ¿tan harta has acabado de España?
Solicité la nacionalidad portuguesa por romanticismo y también por una razón práctica: pagar en Portugal los impuestos que podría generar la obra de José Saramago en el mundo. Él era portugués, pagar los impuestos en su país era, para él, insisto, una regla de obligado cumplimiento, y yo no quise abandonar esta práctica, así que me hice portuguesa. O también portuguesa. Ya me queda menos para cumplir mi sueño, que es tener tantas nacionalidades como amigos en el mundo…

Saramago apostaba por una Unión Ibérica entre España y Portugal, ¿estás de acuerdo con esa idea utópica?
Estoy de acuerdo en la necesidad de entendimiento entre los pueblos y las sociedades, y parece que en eso estamos, basta ver la gente que va y viene de un extremo a otro de la península, recorriéndola… En cuanto a los estados, prefiero el federalismo a otra cosa, pero la verdad es que el discurso de las banderas y las patrias no me emociona, como decía la canción que cantábamos contra Franco, la música militar no me hace levantar…

Ahora que se aproxima el referéndum en Cataluña no sería tan mala idea…
Pues sí, sería bueno que los catalanes y los otros pueblos de la península se pudieran expresar acerca de si quieren formar parte de un estado federal o confederal atendiendo a la geografía y a las razones históricas… Pero esto no va a pasar, el poder político es conservador, en el caso de España lo de “una, grande y libre” está muy arraigado, parece, según se oye, que tendremos estas fronteras hasta el final de los tiempos, cueste lo que cueste, dicen algunos… Y será así hasta que las sociedades consigan argumentar en todos los foros, expresándose con razones y diciendo claro si quieren ser plurales y plurinacionales. Yo prefiero ser plural e igual a otros que cobijarme en discursos excluyentes, que detesto.

Lo cierto es que en España pasan cosas extrañas, como ese fiscal anticorrupción que tenía una cuenta en Panamá. ¿Eso también pasa en Portugal?
Sí pasa: la corrupción está en los seres humanos y en todas partes. Luego, como ciudadanos, tenemos que votar y vigilar para que haya leyes justas. Ese es nuestro trabajo.

Libertad, igualdad, fraternidad… qué lejos parecen quedar esos nobles ideales ¿no?
Intentemos hacerlos posibles. Lo lejano se acerca si nos acercamos.

Siempre has sido una feminista convencida. Con Trump en el poder, ¿es el feminismo más necesario que nunca?
Trump es una anécdota, terrible, sí, pero anécdota. El feminismo es necesario porque es una teoría de igualdad entre hombres y mujeres. Sin esta igualdad no puede haber justicia. Somos diversos pero iguales. Los movimientos feministas estamos tratando de vencer inercias, prácticas y teorías históricas para hacer del planeta un lugar en que nacer y vivir como mujer no sea una condena o un hándicap. El feminismo es dignidad. Por cierto, esta tesis de dignidad está presente en todos los libros de José Saramago, no necesitaba teorizar para atribuir a las mujeres el papel de coprotagonistas que la historia y el patriarcado que dicta los comportamientos vienen negando desde siempre, aunque, ya lo sabemos, enfrentando al sentido común.

En tus conferencias vas intercalando párrafos de la obra de Saramago, como tratando de mantener viva su voz. ¿Te preocupa que esa voz se pueda perder algún día?
No me preocupa y no creo que suceda: es demasiado limpia, inteligente, lúcida, compasiva y solidaria esa voz como para perderse. José Saramago, y lo sabemos millones de lectores, es nuestro mejor yo, no lo vamos a perder.

¿Te molesta que te sigan conociendo como “la viuda de Saramago”?
Me molesta mucho porque nunca me he definido a mí misma por mis vinculaciones familiares o afectivas, por ser hija, madre o esposa, mucho menos por haber sido algo de eso… Y me molesta que los compañeros me llamen así porque demuestran un alto nivel de pereza intelectual, es tirar por lo obvio, lo más fácil. Definir a una persona en base a las relaciones que tiene con otra es faltarle el respeto: somos lo que hacemos de nosotros mismos, no lo que dicta el entorno que tenemos, sea el que sea. O sea, muerdo si oigo lo de “viuda de”. Puestos a simplificar, se puede decir que trabajo en el “proyecto Saramago”.  Por lo menos da qué pensar.