Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

domingo, 6 de setembro de 2015

Jorge Salgueiro - "Ensaio sobre a Cegueira, um Requiem pela Humanidade"

Breve trecho que pode ser visualizado aqui 

"Oporto National Orchestra and Oporto Opera 
Chorus plays Exultate Jubilate from "Blindness, A Requiem for Humankind" 
conducted by the composer (Jorge Salgueiro)"


Do blog "A Nossa Rádio" de Álvaro Ferreira, um artigo sobra as adaptações musicais da sua obra - Indispensável Leitura

Artigo original pode ser consultado e visualizado, aqui
em http://nossaradio.blogspot.pt/2010/06/jose-saramago-na-musica-portuguesa.html

(Fotografia que acompanha o artigo de Álvaro Pereira no blog mencionado)

Provavelmente o melhor artigo sobre as adaptações musicais dos textos de José Saramago

"Muito antes do compositor italiano Azio Corghi (*), se ter debruçado sobre a produção romanesca e teatral de José Saramago, já a obra poética do autor – que compreende os livros "Os Poemas Possíveis" (Portugália, 1966), "Provavelmente Alegria" (Livros Horizonte, 1970) e "O Ano de 1993" (Futura, 1975) – merecera a atenção de grandes compositores e intérpretes portugueses. Luís Cília, durante o exílio em França, foi o primeiro a musicar e a cantar a poesia de Saramago, na trilogia "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours" (1967, 1969 e 1971), portanto, cerca de três décadas antes da atribuição do Prémio Nobel da Literatura. Seguiu-se Manuel Freire, com os poemas "Fala do Velho do Restelo ao Astronauta" (1971), "Ouvindo Beethoven" (1973) e "Dia Não" (1978), que viriam a ser regravados com novos arranjos, em 1999, no álbum "As Canções Possíveis". Com os outros nove poemas que completam o alinhamento deste CD, Manuel Freire afirmou-se o mais dedicado intérprete da poesia de José Saramago, e quiçá o que melhor a cantou.
Embora de forma mais avulsa, também Pedro Barroso, Carlos do Carmo, Mísia, Amélia Muge, Fernando Tordo e Marco Oliveira juntaram os seus nomes à galeria dos que deram voz cantada aos versos do grande escritor.
Aqui fica o rol das versões conhecidas, perfazendo as três dezenas, considerando-se as regravações que alguns poemas tiveram. É muito provável que a lista esteja incompleta e, nessa conformidade, os leitores ficam convidados a indicar as eventuais ausências (contacto: ajferreira74@gmail.com).
A ordem é cronológica e alfabética (no caso de temas pertencentes ao mesmo disco).

1. Contracanto – Luís Cília (in LP "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", vol. 1, Moshé-Naim, 1967)
2. Dia Não – Luís Cília (in LP "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", vol. 1, Moshé-Naim, 1967; CD "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", Moshé-Naim, 1996)
3. Há-de haver – Luís Cília (in LP "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", vol. 2, Moshé-Naim, 1969; CD "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", Moshé-Naim, 1996)
4. Não me peçam razões – Luís Cília (in LP "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", vol. 2, Moshé-Naim, 1969; CD "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", Moshé-Naim, 1996)
5. Poema à boca fechada – Luís Cília (in LP "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", vol. 3, Moshé-Naim, 1971)
6. Venham leis – Luís Cília (in LP "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", vol. 3, Moshé-Naim, 1971; CD "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", Moshé-Naim, 1996)
7. Fala do Velho do Restelo ao Astronauta – Manuel Freire (in EP "Dulcineia", Zip Zip, 1971; CD "Pedra Filosofal", Strauss, 1993, CNM, 2004)
8. Ouvindo Beethoven – Manuel Freire (in EP "Abaixo D. Quixote", Sassetti, 1973; CD "Pedra Filosofal", Strauss, 1993, CNM, 2004)
9. Dia Não – Manuel Freire (in LP "Devolta", Diapasão/Lamiré, 1978)
10. Nasce Afrodite Amor Nasce o Teu Corpo – Pedro Barroso (in LP "Água Mole em Pedra Dura", Sassetti, 1978; CD "Cartas a Portugal", Strauss, 2000)
11. Aprendamos o Rito – Carlos do Carmo (in LP "Mais do Que Amor é Amar", Philips/Polygram, 1986, reed. Philips/Polygram, 1996)
12. Fado Adivinha – Mísia (in CD "Fado", BMG Ariola, 1993)
13. Nenhuma Estrela Caiu – Mísia (in CD "Garras dos Sentidos", Erato, 1998)
14. Aprendamos o Rito – Carlos do Carmo (in CD "Ao Vivo no CCB: Os Sucessos de 35 Anos de Carreira", EMI-VC, 1999)
15. A Ponte – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
16. Circo – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
17. Dia Não – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
18. Dispostos em Cruz – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
19. É Tão Fundo o Silêncio – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
20. Fala do Velho do Restelo ao Astronauta – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
21. Jogo do Lenço – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
22. Nem Sempre a Mesma Rima – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
23. Ouvindo Beethoven – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
24. Retrato do Poeta Quando Jovem – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
25. Tenho a Alma Queimada – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
26. Tenho um Irmão Siamês – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
27. Se Não Tenho Outra Voz – Amélia Muge (in CD "A Monte", Vachier & Associados, 2002)
28. Fado Adivinha II – Mísia (in CD "Drama Box", Liberdades Poéticas/EMI-VC, 2005)
29. Circo – Fernando Tordo (in CD "Tributo a los Laureados Nobel", Factoría Autor, 2005)
30. Retrato do Poeta Quando Jovem – Marco Oliveira (in CD "Retrato", HM Música, 2008)

A estas versões cantadas, acrescentam-se as gravações de poesia dita/recitada. Além dos espécimes presentes em edições discográficas, como é o caso do poema "Circo", recitado por Vítor de Sousa no CD "No Palco da Poesia" (Ovação, 1995, reed. 2000), há que considerar os registos existentes no arquivo sonoro da RDP, na voz de António Cardoso Pinto, Paulo Rato e outros.
Sem prejuízo da transmissão de excertos de entrevistas de José Saramago, era expectável e desejável que a direcção de programas da Antena 1, nos dias em que Portugal se despediu do seu (primeiro e único, até agora) Nobel da Literatura, deitasse mão aos seus poemas – os cantados e os recitados – e os desse a ouvir, se não na íntegra, numa boa parte. Mas não. Será que Rui Pêgo e os seus adjuntos não tinham conhecimento da existência de tão importante acervo fonográfico? Se não tinham, podiam ter-se dignado perguntar a quem os soubesse informar. Enfim... mais um triste episódio que põe a nu as gritantes deficiências que se vêm verificando no serviço público de radiodifusão.

(*) Azio Corghi compôs as seguintes obras, baseadas em livros/textos de José Saramago: "Blimunda" (1989 - ópera, a partir do romance "Memorial do Convento"); 
"Divara" (1993 - ópera, a partir da peça "In Nomine Dei"); 
"La Morte di Lazzaro" (1995 - cantata dramática); 
"Cruci-Verba" (2001 - para voz recitante e orquestra, a partir do romance "O Evangelho Segundo Jesus Cristo"); 
"De Paz e de Guerra" (2002 - cantata para coro e orquestra); 
"Il Dissoluto Assolto" (2005 - ópera, a partir da peça "Don Giovanni ou o Dissoluto Absolvido").

Em Portugal, Jorge Salgueiro é autor de "Ensaio sobre a Cegueira: um Requiem pela Humanidade" (2004 - ed. Tradisom, 2005), composto para a adaptação dramática do romance "Ensaio sobre a Cegueira", levada à cena pela companhia de teatro "O Bando", em co-produção com o Teatro Nacional de São João (Porto)."

No Le Monde o artigo "José Saramago, la mécanique des mots" por Macha Séry (Via FJS)



O artigo pode ser acessado, via (custo indicado no site do Le Monde) 


"Son patronyme est dû à une bourde de l’employé ­municipal d’Azinhaga, au Portugal, qui ne connaissait son père, José de Sousa, que par son surnom : « Saramago », terme désignant une plante ­sylvestre à quatre pétales dont se nourrissent les miséreux en ­période de disette. Pauvre, l’homme l’était. Il préféra, d’ailleurs, mentir sur la date de naissance de son fils – le 16 novembre, et non le 18 novembre 1922 – pour ne pas avoir à ­s’acquitter de l’amende prévue en cas de non-déclaration d’enfant à l’état civil dans les trois semaines suivant l’accouchement.

Comme ses propres parents, bergers, José de Sousa était un ouvrier agricole louant ses bras à la journée. Aussi José de Sousa ­Saramago, le fils, grandit-il au sein d’une famille de paysans sans terre et analphabètes. Si brillant élève soit-il, il est inconcevable qu’il poursuive en enseignement général, passé l’âge de 12 ans. Il est donc orienté vers l’Ecole industrielle d’Afonso ­Domingues de Lisbonne qui forme en cinq ans serruriers, soudeurs, ajusteurs, tourneurs fraiseurs et mécaniciens.

Les ­archives de la Fondation ­José-Saramago conservent sa carte d’élève. Le garçon y apparaît triste. C’est, il est vrai, un adolescent ­contemplatif et solitaire. Il s’initie à la physique, à la chimie, au dessin ­industriel. Il apprend à usiner des pièces de métal, à démonter et ­remonter des moteurs. Un jour, il s’amuse en classe avec un pointeau et le casse. Le professeur exige qu’il le remplace. Trop cher pour ses parents. « Pendant peut-être deux semaines, après-midi du ­samedi et dimanche inclus, couteau (...)"



Poema "Ouvindo Beethoven" musicado por Manuel Freire - "Os Poemas Possíveis" de 1966

Pode ser visualizado e ouvido, via YouTube, aqui em

"OUVINDO BEETHOVEN"
Venham leis e homens de balanças,
Mandamentos daquém e dalém mundo,
Venham ordens, decretos e vinganças,
Desça o juiz em nós até ao fundo.

Nos cruzamentos todos da cidade,
Brilhe, vermelha, a luz inquisidora,
Risquem no chão os dentes da vaidade
E mandem que os lavemos a vassoura.

A quantas mãos existam, peçam dedos,
Para sujar nas fichas dos arquivos,
Não respeitem mistérios nem segredos,
Que é natural nos homens serem esquivos.

Ponham livros de ponto em toda a parte,
Relógios a marcar a hora exacta,
Não aceitem nem votem noutra arte
Que a prosa de registo, o verso data.

Mas quando nos julgarem bem seguros,
Cercados de bastões e fortalezas,
Hão-de cair em estrondo os altos muros
E chegará o dia das surpresas.

"Os Poemas Possíveis", 1966