Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

quarta-feira, 6 de maio de 2015

A morte, a mulher morte, a mulher... "As Intermitências da Morte"


(...) «A morte, porém, esta que se fez mulher, tira da bolsa uns óculos escuros e com eles defende os seus olhos agora humanos dos perigos de um oftalmia mais do que provável em quem ainda terá de habituar-se às refulgências de uma manhã de verão.» (...) Página 190

(...) «Então, apareceu o violoncelista, Ao vê-la, estacou, chegou mesmo a esboçar um movimento de recuo, como se vista de perto, a mulher fosse outra cousa que mulher, algo de outra esfera, de outro mundo, da face oculta da lua.» (...) Página 199

(...) «Ele adormeceu, ela não. Então ela, a morte, levantou-se, abriu a bolsa que tinha deixado na sala e retirou a carta cor violeta. (...) A morte voltou para a cama, abraçou-se ao homem e, sem compreender o que lhe estava a suceder, ela que nunca dormia, sentiu que o sono lhe fazia descair suavemente as pálpebras.» (...) Página 214

"As Intermitências da Morte"
Caminho, 1.ª edição