Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

quinta-feira, 10 de março de 2016

José Saramago e o seu "Camões"


“Entra, chegaste à tua casa”: assim entrou Camões na vida de José Saramago. 
No momento em que Manuel Maria Carrilho, ministro da Cultura de Portugal, anunciava a José Saramago que lhe tinha sido concedido o maior galardão literário da língua portuguesa" (...)
(...) "O animal entrou pela porta aberta do jardim, mexendo sem jeito as pernas, um pouco desajeitado, feliz por ninguém o maltratar. Quando Saramago apareceu a anunciar que tinha recebido o Prémio Camões, soubemos, soubemo-lo nesse instante, que o cão que tinha encontrado a sua casa não ia ter outro nome que o do grande poeta português. E assim, pelo menos em Lanzarote, Camões foi mencionado centenas de vezes por dia, foi vida e foi homenagem. E este cão doce e nobre, que nunca aprendeu a comer devagar porque até chegar à Casa tinha tido que lutar contra a fome e o abandono, com a sua gravata branca desenhada no pelo negro, que foi o modelo para “O Achado” d’ A Caverna, um cão que, como todos os cães que Saramago inventa, é a melhor resposta animal à melhor consciência humana" (...)

O presente texto, de Pilar del Río, pode ser recuperado através da página da 
Fundação José Saramago, aqui

Feira do Livro de Oslo "Contar a vida de todos e de cada um" Ideias sobre Ficção e História (Cadernos de Lanzarote Diário III - 28/10/1995)

O presente texto, pode ser consultado na página da Fundação José Saramago, aqui
em http://www.josesaramago.org/contar-a-vida-de-todos-e-de-cada-um/
Está também presente no livro "Cadernos de Lanzarote Diário III", dia 28 de Outubro (Caminho, páginas 180 a 190), relacionado com a sua visita à Feira do Livro de Oslo, acompanhado por Odd Karsten Krogh (editora Cappelen).

"Contar a vida de todos e de cada um"

"Venho falar-vos de História e de Ficção. Venho falar-vos, sobretudo, das ambíguas relações que vêm mantendo nos últimos tempos, uma com a outra, a Ficção e a História, ao ponto de já nos perguntarmos se não estará a haver na História demasiada Ficção e, por outro lado, equilibrando a dúvida, se haverá na Ficção suficiente História… Parecer-vos-á talvez isto um mero jogo de palavras, mas espero, se conseguir levar ao fim os meus raciocínios antes que se acabe a vossa paciência, vir a reunir umas quantas razões que defendam o tema e o absolvam das primeiras suspeitas.

Consideremos, em primeiro lugar, a História como Ficção. Trata-se de uma proposição aparentemente temerária, que poderia mesmo introduzir de modo sub-reptício a insinuação de que não há diferenças substanciais entre Ficção e História. Concluiríamos, neste caso, provavelmente fazendo nascer um novo caos, que tudo no mundo seria Ficção, que nós próprios não seríamos mais do que produtos sempre cambiantes de todas as ficções criadas e a criar, tanto as nossas como as alheias. Seríamos, simultaneamente, os autores e as personagens de uma Ficção Universal sem outra realidade do que ter-se constituído como uma espécie de mundo paralelo. Embora reconheça existir no que acabo de dizer algo do espírito de paradoxo, tentarei pôr do meu lado alguns argumentos acaso dignos de atenção.

Desde logo, de acordo com esta hipótese, a primeira tarefa do historiador seria seleccionar factos, trabalhando sobre aquilo que denominarei tempo informe, quer dizer, esse Passado a que apeteceria chamar puro e simples, se isso não fosse uma contradição em termos. Recolhidos os dados considerados necessários, a segunda tarefa do historiador seria organizá-los de modo coerente, obedecendo ou não a objectivos prévios, mas, em qualquer caso, transmitindo sempre uma ideia de necessidade inelutável, como a expressão de um Destino. Não esqueçamos que tais selecções de factos se exercem, em regra, sobre consensos ideológicos e culturais concretos, os quais fazem da História, entre os diversos ramos do conhecimento, o menos capaz de surpreender.

É indiscutível que o historiador estará obrigado, sempre e em todos os casos, a escolher factos entre factos. É igualmente óbvio que, ao proceder a essa escolha, ele terá de abandonar deliberadamente um número indeterminado de dados, algumas vezes em nome de razões de classe ou de Estado, ou de natureza política conjuntural, outras vezes acatando, conscientemente ou não, as imposições duma estratégia ideológica que necessite, para justificar-se, não da História, mas de uma História. Esse historiador, na realidade, não se limitará a escrever História. Ele fará História. O historiador, desde que consciente das consequências políticas e ideológicas do seu trabalho, tem de saber que o Tempo que assim esteve a criar vai aparecer aos olhos do leitor como uma lição magistral, a mais magistral de todas as lições, já que o historiador surge ali como definidor de um certo mundo entre todos os mundos possíveis. Nesse outro acto de Criação, o historiador decide o que do Passado é importante e o que do Passado não merece atenção.

Algumas vezes, no entanto, este poder autoritário parece não ser bastante para libertar-nos daquele horror ao vazio que, sendo uma das características dos povos primitivos, vem, afinal, a encontrar-se em não poucos espíritos cultivados. Um historiador como Max Gallo começou a escrever romances para equilibrar pela Ficção a insatisfação que lhe causava o que considerava uma impotência real para expressar na História o Passado inteiro. Foi buscar às possibilidades da Ficção, à imaginação, à elaboração sobre um tecido histórico definido, o que sentira faltar-lhe como historiador: a complementaridade duma realidade. Não estaria muito longe deste sentimento, suponho eu, o grande George Duby, quando, na primeira linha de um dos seus livros, escreveu: Imaginemos que… Precisamente aquele imaginar que antes havia sido considerado um pecado mortal pelos historiadores positivistas e seus continuadores de diferentes tendências.

Tenho ouvido que existe uma crise da História, tão grave que ameaça matá-la, ou a matou já… Se assim é – e eu não sou ninguém para ousar pronunciar-me sobre tão transcendente questão –, interrogo-me se tal crise não será causa directa, ainda que não única, da ressurreição, em condições diferentes e com diferentes resultados estáticos, daquilo a que, erradamente a meu ver, continuamos a chamar «romance histórico». E também, se não se tratará, afinal, de uma expressão particular doutra crise mais ampla: a da representação, a crise da própria linguagem como representação da realidade.

Ora, se a crise existe (a da História, ou outra, geral, de que aquela seria apenas uma manifestação parcelar), se em tudo o que nos rodeia é possível encontrar conexões com esta impressão de fim de um tempo que andamos a sentir – então talvez se torne mais claro por que nos estamos voltando para o romance dito histórico, levados por uma ansiedade que decerto faria sorrir com algum desprezo intelectual, se ainda fossem deste mundo, os que, no século passado, fervorosamente acreditavam no Progresso. Olhar-nos-iam com piedade, perguntariam como foi possível que, das sólidas certezas que eles tinham, tivesse nascido esta insegurança que nós temos.

Sou autor de um livro que se chama Viagem a Portugal. Trata-se de uma narrativa de viagem, como tantas que se escreveram nos séculos xvii e xviii, quando a Europa começou a viajar dentro da Europa, e os viajantes descreviam as suas experiências e aventuras, produzindo de caminho alguns documentos literários preciosos, inclusive para o estudo da história das mentalidades. Foi com um espírito afim que viajei por Portugal, foi igualmente com esse espírito que escrevi Viagem a Portugal.

O livro não é, portanto, um roteiro, um guia de viajantes, embora, necessariamente, contenha muito do que se espera encontrar nesse tipo de textos. Fala-se de Lisboa, do Porto, de Coimbra, das cidades do meu país, fala-se das aldeias, das paisagens, das artes, das pessoas. Imaginemos agora que o autor resolveu fazer nova viagem para, terminada ela, escrever outro livro, mas que, nessa segunda viagem, não visitará nenhum dos lugares por onde tinha passado antes. Quer dizer, nesta segunda viagem, o autor não irá a Lisboa, não irá ao Porto, não irá a Coimbra, não irá a nenhum lugar onde já tivesse estado. Contudo, parece-lhe que, com toda a legitimidade, poderá tornar a dar, a esse novo livro, o título de Viagem a Portugal, uma vez que de Portugal continua a tratar-se… Levemos mais longe o jogo e imaginemos que o autor fará uma terceira, uma quarta, uma quinta, uma décima, uma centésima viagem, obedecendo sempre ao princípio de nunca ir aonde foi antes, e que escreverá outros tantos livros, em que, por fim, inevitavelmente, deixará de haver qualquer alusão a nomes de lugares habitados, nada a não ser a simples descrição de uma imagem, aparentemente sem quaisquer pontos de identificação com a entidade cultural e histórica a que damos o nome de Portugal. A pergunta derradeira será esta: pode ainda o centésimo livro chamar-se Viagem a Portugal? Respondo afirmativamente: podemos e devemos chamar-lhe Viagem a Portugal, mesmo que o leitor não consiga reconhecer nele, por mais atento que esteja à leitura, o país que lhe foi prometido no título…

Este jogo, ainda que à primeira vista não o pareça, tem muito que ver com a relação que mantemos com a História. Diria eu que a História, tal corno foi escrita, ou – repetindo a provocação – tal como a fez o historiador, é o primeiro livro. Não esqueço, obviamente, que o mesmo historiador poderá fazer, ele próprio, outras viagens ao tempo por onde antes viajou, esse tempo que, graças à sua intervenção, vai deixando de ser tempo informe, vai passando a ser História, e que as novas visões, os novos pontos de vista, as novas interpretações irão tornando cada vez mais densa e substancial a imagem histórica que do Passado nos vinha sendo dada. Nas grandes zonas obscuras que sempre existirão, mesmo no que se supõe já conhecido, é que o romancista terá o seu campo de trabalho.

Creio bem que o que está subjacente a esta nova inquietação é a consciência que temos da impossibilidade duma reconstituição plena do Passado. E que, não podendo reconstituí-lo, somos tentados – sou-o eu, pelo menos – a corrigi-lo. Quando digo corrigir, corrigir o Passado, não o é no sentido de emendar os factos da História (essa nunca poderia ser a tarefa de um romancista), mas sim, se se me permite a expressão, introduzir nela pequenos cartuchos que façam explodir o que até aqui parecia indiscutível; por outras palavras, substituir o que foi pelo que poderia ter sido. Certamente se argumentará que se trata de um esforço gratuito, inútil, uma vez que o que hoje somos não resultou do que poderia ter sido, mas do que efectivamente é . No entanto, é minha convicção de que se a leitura histórica feita pelo romance for uma leitura crítica, essa nova operação poderá provocar uma espécie de instabilidade, de vibração temporal, uma perturbação causada pelo confronto entre o que sucedeu e o que poderia ter sucedido, como se os factos começassem, saudavelmente, a duvidar de si mesmos…

São duas as atitudes possíveis ao romancista que escolheu, exclusiva ou acidentalmente, os caminhos da História: a primeira, discreta e respeitosa, consistirá em reproduzir, ponto por ponto, os factos históricos conhecidos, sendo a ficção, nesse caso, mera servidora duma fidelidade que se deseja a salvo de acusações de falta de rigor de qualquer tipo; a segunda, mais ousada, levará o autor a entretecer num tecido ficcional que se vai manter predominante os dados históricos que lhe servirão de suporte. Num caso como no outro, porém, estes dois vastos mundos, o mundo das verdades históricas e o mundo das verdades ficcionais, aparentemente inconciliáveis, serão harmonizados pela instância narradora.

Está aqui, a meu ver, a questão essencial. Conhecemos aquele narrador que se comporta de um modo imparcial, que vai dizendo o que acontece, conservando sempre a sua própria subjectividade fora dos conflitos de que é espectador e relator. Mas há um outro tipo de narrador, muito mais complexo, que não tem uma voz única: é um narrador que parece substituível, um narrador que o leitor vai reconhecendo constante ao longo da narrativa, mas que muitas vezes lhe dará a impressão estranha de ser outro. Digo outro porque ele variou de ponto de vista, podendo chegar até a criticar o ponto de vista daquele que foi primeiro narrador. Esse narrador instável será também o instrumento ou o sopro de uma voz colectiva. Será igualmente uma voz particular que não se sabe donde vem e que se recusa a dizer quem é, ou usa de arte bastante para levar o leitor a sentir-se identificado com ele, a ser, de algum modo, ele. E pode, enfim, mas não explicitamente, ser a voz do próprio autor: este, que fabricou todos os seus narradores, não está reduzido a saber só o que as suas personagens sabem, ele sabe que sabe e quer que isso se saiba… 

O que aconteceu, o que acontece e o que acontecerá. Graças a esta forma de conceber, não apenas o tempo histórico, mas o Tempo tout court projectando-o, por assim dizer, em todas as direcções, autorizo-me a pensar que o meu trabalho no campo do romance é capaz de produzir algo como uma oscilação contínua em que o leitor directamente participa, graças a uma contínua provocação que consiste em ser-lhe negado, por processos que são sempre de raiz irónica, o que primeiro lhe havia sido dito, criando no seu espírito uma impressão de dispersão da matéria histórica na matéria ficcionada, o que não só não significa desorganização de uma e de outra, como aspira a ser uma reorganização de ambas.

Admito que a declaração inicial, de ser o historiador um seleccionador de factos, pareça demasiado crua e chocante. Direi, então, em termos mais técnicos, citando um teórico da literatura, que «o historiador realiza uma rarefacção do referencial, criando uma espécie de malha larga, perfeitamente tecida, mas que envolve espaços de obscurecimento ou de redução dos factos». Ora, deste ponto de vista, parece-me bastante pertinente dizer que a História se nos apresenta como um parente próximo da Ficção, porquanto, ao «rarefazer o referencial», procede a omissões voluntárias de que irão resultar modificações no panorama do período observado, com a forçosa consequência do estabelecimento de relações diferentes entre os factos «sobreviventes». Aliás, é interessante verificar como certas escolas históricas recentes começaram a sentir-se inquietas quanto ao rigor efectivo duma História como a que vinha sendo feita. Lendo esses historiadores, temos a impressão de estar diante de um romancista dado aos temas históricos, não porque eles escrevam História romanceada, mas porque reflectem uma insatisfação tão profunda que, para aquietar-se, teve de abrir-se à imaginação, uma imaginação que manterá como suporte essencial os factos da História, mas que abandonará a sua antiga e exclusiva relação com eles, de sujeição resignada ao império em que se tinham instituído. Não faltará quem considere que, por esta via, a História se tornou menos científica. É uma questão em cuja discussão não me atreveria a participar. Como romancista, basta-me pensar que sempre será melhor ciência aquela que for capaz de me proporcionar urna compreensão dupla: a do Homem pelo Facto, a do Facto pelo Homem.

Quando olho o Passado, a impressão mais forte é a de estar perante um imenso tempo perdido. A História, e também a Ficção que busca na História o seu objecto, são, de alguma maneira, viagens através do tempo, percursos, definições de itinerários. Apesar de tanta História escrita, apesar de tanta Ficção sobre casos e pessoas do Passado, é esse tempo enigmático, a que chamei perdido, que continua a fascinar-me. Para dar um só exemplo, interessa-me, claro está, a batalha de Austerlitz, mas interessar-me-ia muito mais conhecer as pequenas histórias que vieram a ser consequência dessa História de formato grande, alcançar uma compreensão real das inúmeras e ínfimas histórias pessoais, desse tempo angustiosamente perdido e informe, o tempo que não retivemos, o tempo que não aprendemos a reter, a substância mental, espiritual e ideológica de que afinal somos feitos.

É fácil dizer – eu próprio cedi algumas vezes à comodidade de tão flagrante tautologia – que, sendo certo que fora da História nada existe, toda a Ficção é, e não pode deixar de ser, «histórica». Mas não têm faltado espíritos sarcásticos para insinuar que um romancista que trabalhe literariamente sobre a História procede assim por necessidade de evasão, por incapacidade de entender o Presente e de se adaptar a ele, do que resultaria ser o «romance histórico» o mais acabado exemplo de fuga à realidade. É uma acusação tão fácil quanto habitual. Pelo contrário, é precisamente uma consciência intensíssima, dolorosa, do Presente, que leva este romancista a olhar na direcção do Passado, não como um inalcançável refúgio, mas para conhecer-se melhor. Não estou a dizer nada de original. No seu livro O Mediterrâneo, Fernand Braudel escreve, com a simplicidade duma revelação, algumas linhas que resumem quanto aqui tenho dito: «A História não é outra coisa que uma constante interrogação dos tempos passados, em nome dos problemas, das curiosidades, e também das inquietações e angústias com que nos rodeia e cerca o tempo presente».

Observe-se como tal definição poderia ser transportada, palavra por palavra, para o Romance. Direi igualmente que o «romance histórico», também ele, «não é outra coisa que uma constante interrogação dos tempos passados, em nome dos problemas, das curiosidades, e também das inquietações e angústias de que nos rodeia e cerca o tempo presente». Assim sendo, História e Romance seriam tão-somente expressões da mesma inquietação dos homens, os quais, como múltiplos Janos bifrontes, voltados a uma e a outra parte, e do mesmo modo que tentam desvendar o oculto rosto do Futuro, teimam em procurar, na impalpável névoa do Tempo, um Passado que constantemente se lhes escapa e que hoje, talvez mais do que nunca, quereriam integrar no Presente que ainda são.

Benedetto Croce escreveu um dia: «Toda a História é história contemporânea». É também à luz destas palavras reveladoras que tenho vindo a realizar o meu trabalho de escritor, embora esteja pronto a reconhecer que o Mestre merecia um aluno mais capaz e que a lição teria o direito de esperar frutos mais saborosos."
José Saramago

José Saramago : «Il faudrait réformer la démocratie» - Lucie Geffroy entrevista José Saramago para o "L’Orient Littéraire" (02/08/2007)

"Primeiro, gosto das mulheres. Penso que elas são mais fortes, mais sensíveis e que elas têm mais bom-senso do que os homens. Todas as mulheres do mundo não são assim, mas digamos que é mais fácil encontrar qualidades humanas nelas do que no género masculino. Todos os poderes políticos, económicos, militares são um negócio de homem. Durante séculos, a mulher teve de pedir licença ao seu marido ou ao seu pai para empreender o que quer que fosse. Como pudemos viver tanto tempo a condenar a metade da humanidade à subordinação e à humilhação?"
"José Saramago: ‘Il faudrait réformer la démocratie"
”, L’Orient le Jour, Beirute, 2 de agosto de 2007 - Entrevista realizada por Lucie Geffroy

Fotografia © Hannah / Opale

A entrevista pode ser aqui consultada, via
http://www.lorientlitteraire.com/article_details.php?cid=6&nid=5853

"Aux points cardinaux d’une bibliographie épaisse, éclectique et baroque, on compte un roman culte, Le dieu manchot, un vibrant hommage à Pessoa (L’année de la mort de Ricardo Reis), une version subversive de l’Évangile (L’Évangile selon Jésus-Christ) et une fable toute kafkaïenne (Tous les noms). La lucidité, son dernier roman traduit en français, une fois de plus mené tambour battant avec des dialogues qui s’enchaînent sans guillemets et un récit qui bascule brutalement dans le fantastique, est un autre livre de colère où l’auteur s’insurge cette fois-ci contre la prétendue démocratie... Avec la simplicité qui caractérise les grands hommes, José Saramago a reçu L’Orient Littéraire dans sa petite maison de Lisbonne. À 84 ans, il n’a rien perdu de son mordant.

Vous avez dit de La lucidité, traduit en français fin 2006, qu’il s’agissait de votre livre le plus subversif. Pourquoi ? 
Dans nos sociétés, les hommes politiques et les médias ont beaucoup de motifs de se taire. Certains sujets sont comme entourés d’une enveloppe de silence. La briser, c’est faire acte de subversion. Avec La lucidité où j’imagine que 80% des électeurs votent blanc, on a pensé que j’étais favorable à la généralisation du vote blanc et donc un ennemi de la démocratie. Je ne fais pas l’apologie du vote blanc. Je dis seulement qu’il est important de le distinguer de l’abstention. Les gens qui votent blanc prennent le soin de sortir de chez eux, de se déplacer et de déposer un bulletin qui signifie : ce que vous me proposez ne m’intéresse pas. En France, le vote blanc est considéré comme nul. Je trouve cela scandaleux !

Justement, votre roman peut se lire comme une critique acerbe d’un système démocratique en décadence. La démocratie est-elle en danger selon vous ? 
Non, elle n’est pas en danger, mais elle est amputée, dévoyée. Elle est devenue une comédie. Les candidats font des promesses et les oublient aussitôt. Ce n’est pas vrai que nous vivons en démocratie. Nous nageons en pleine ploutocratie. Or le citoyen est la première victime du mensonge généralisé. Qu’est-ce que la guerre en Irak, sinon un énorme mensonge ? Nous vivons à une époque où l’on peut discuter de tout sauf de la démocratie. Qu’est-elle devenue ? À quoi sert-elle ? Si on se posait ces questions, on arriverait à la conclusion qu’il faudrait sans doute la réformer. Aristote avait établi que dans un système démocratique, le Parlement devait être composé d’une majorité de pauvres et d’une minorité de riches. Maintenant, je me dis qu’Aristote devait être un précurseur de l’humour noir.

En épigraphe de La lucidité, vous avez inscrit : « Hurlons, dit le chien. » À la fin de l’ouvrage, il est question de nouveau d’un chien qui hurle. Pourquoi ces évocations ? 
Le chien de l’épigraphe, c’est vous, c’est moi, c’est tout le monde. C’est quelqu’un qui en a marre d’avoir parlé toute sa vie, pour qui parler ne suffit plus. Alors hurler devient une nécessité. À la fin du livre, le chien hurle parce qu’il assiste à ce qu’on peut considérer comme un crime d’État. À côté de lui, un aveugle dit avoir horreur des chiens qui hurlent. C’est une façon d’illustrer que ceux qui ne veulent pas voir la vérité en face se voilent la face. D’un point de vue littéraire, j’aime l’idée de conclure un roman sur le hurlement d’un chien. L’image symbolise la question que je pose dans tous mes romans : que signifie la vie ?

D’ailleurs dans vos œuvres, le chien est souvent un personnage à part entière, parfois doté de pouvoirs magiques.
Oui, pour moi, le chien est l’incarnation de la pureté morale. Dans La lucidité, il vient secourir sa maîtresse et lèche ses larmes. Quand je ne serai plus de ce monde, avant la fin de l’oubli de tout ce que j’ai écrit, j’aimerais que « le chien des larmes » soit toujours présent. Comme un personnage immortel. Je suis très heureux d’avoir inventé ce chien-là et de l’avoir nommé ainsi.

Vous avez participé en 1974 à la Révolution des œillets qui entraîna la chute de la dictature salazariste et n’avez jamais caché vos engagements politiques. Êtes-vous toujours membre du Parti communiste ? 
Bien sûr ! Vous vous demandez comment je peux encore être communiste presque 20 ans après la chute du mur de Berlin ? Tout simplement parce que je ne pourrais jamais être favorable au capitalisme. C’est à cause des hormones que la barbe pousse, n’est-ce pas ? Alors disons que je suis un communiste hormonal. C’est en moi. Je n’y peux rien. C’est aussi un état d’esprit. Brejnev, Staline et bien d’autres ont très vite perdu leur état d’esprit communiste. On voit ce que ça a donné...Quant à la Chine, qu’on arrête de dire qu’il s’agit d’un pays communiste alors qu’une économie ultracapitaliste s’y développe depuis des années.

Dans La lucidité, un personnage féminin se distingue par sa force morale et son insoumission. Dans Le dieu manchot, Blimunda avait la faculté de voir à l’intérieur des êtres. La plupart de vos romans mettent en scène des personnages féminins très forts. Les femmes ont-elles particulièrement marqué votre vie ? 

D’abord, j’aime les femmes. Je trouve qu’elles sont plus fortes, plus sensibles et qu’elles ont plus de bon sens que les hommes. Toutes les femmes du monde ne sont pas comme ça, mais disons qu’il est plus facile de trouver des qualités humaines chez elles que dans le genre masculin. Tous les pouvoirs politiques, économiques, militaires sont une affaire d’homme. Pendant des siècles, la femme a dû demander la permission à son mari ou à son père pour entreprendre quoi que ce soit. Comment a-t-on pu vivre aussi longtemps en condamnant la moitié de l’humanité à la subordination et à l’humiliation ? Les hommes et les femmes hier, les Juifs et les Palestiniens aujourd’hui, je suis frappé par l’incapacité des humains à vivre ensemble dans le respect mutuel. Comme si l’Autre devait nécessairement être un ennemi. L’Autre est simplement l’Autre. L’Autre est comme moi. Il a le droit de dire « je ». Nous, hommes blancs, civilisés et riches, n’acceptons pas que l’Autre dise « je ».

C’est pour leur rendre justice que vous faites cette place aux femmes dans vos romans ? 
À vrai dire, je ne le fais pas exprès. À l’heure de commencer un roman, je ne cherche pas à tout prix un personnage féminin. C’est l’histoire qui me l’impose. Quand je vois une femme arriver dans le récit pleine de force et de lucidité, je lui dis tout simplement : soyez la bienvenue.

Dans Manuel de peinture et de calligraphie, vous mettez en scène l’histoire d’un homme qui s’interroge sur les fondements de l’art. H. est un peintre qui s’accomplit par l’écriture. Vous-même, pourquoi écrivez-vous ? 
Je crois que l’écrivain écrit pour lui-même. Il n’est pas là pour sauver le monde. Tout au plus, l’écrivain établit des passerelles avec ses lecteurs. Le jour où un lecteur se reconnaît dans ce qu’il lit et qu’il pense : « Si je savais écrire, je dirais cela », alors un nouveau rapport s’établit. Le livre est un pont à sens unidirectionnel qui va du lecteur à l’écrivain et tisse un lien affectif. D’ailleurs, je trouve que dans les éditions des œuvres complètes d’écrivains, il serait bon de glisser quelques lettres de lecteurs. Ce qui est intéressant, ce n’est pas lorsque le lecteur raconte qu’il a adoré votre livre, mais quand il parle de lui. On ne peut que pleurer d’émotion. L’humanité est là, dispersée dans ces lettres.

On sait que vous êtes un admirateur de Fernando Pessoa qui vous a inspiré un roman intitulé L’année de la mort de Ricardo Réis dans lequel vous imaginez la vie de l’un de ses hétéronymes. Plus généralement, quels sont vos maîtres en littérature ? 
Si je devais composer ma famille d’esprit, j’y inscrirais Gogol, Kafka, Montaigne, Cervantès et aussi Antoniu Viél. Antoniu Viél est un jésuite portugais du XVIIe siècle. C’était un mulâtre. Selon moi, on n’a jamais écrit le portugais aussi magnifiquement. Mais si je devais choisir « mon » écrivain, je dirais sans hésiter Franz Kafka. Bien sûr il y a Faulkner, Proust, etc. Mais Kafka est, selon moi, le plus grand romancier du XXe siècle. Il a annoncé ce que nous sommes en train de vivre : l’ère de la bureaucratie totale.

Lisez-vous vos contemporains ? 
En ce moment, je lis La porte du soleil du romancier libanais Élias Khoury. C’est remarquable. J’aime beaucoup la Colombienne Laura Restrepo. En France et en Italie, je trouve moins d’auteurs qui me plaisent. Une littérature « light » a envahi les librairies. C’est bien dommage. Le problème, c’est que je n’ai plus le temps de lire. Je relis des œuvres plus que je ne découvre de nouveaux écrivains. Actuellement, je me replonge dans La vie de Samuel Johnson, de James Boswell. Un pur chef-d’œuvre.

Vos derniers romans semblent plus réalistes que les précédents. Comment expliquez- vous cette évolution dans votre écriture ? 
Je crois que L’Évangile selon Jésus-Christ (1992) a marqué un tournant. Même si presque tous mes romans ont en commun de prendre comme point de départ une situation absurde (une épidémie de cécité, un taux d’abstention record, etc.), il me semble qu’avec L’aveuglement, Les intermittences de la mort et La lucidité, je suis allé plus en profondeur dans ce que je voulais exprimer. Dernièrement, j’ai formalisé cette idée avec l’image de la statue et de la pierre. La statue représente la surface et la pierre représente la matière. Avant L’Évangile selon Jésus-Christ, je n’avais fait que décrire la surface. Après, je suis entré davantage dans l’âme humaine, là où la pierre ne sait pas qu’elle est statue.

En 1992, vous vous êtes exilé aux Canaries suite à la publication de L’Évangile selon Jésus-Christ qui, selon le gouvernement, « portait atteinte au patrimoine religieux des Portugais ». Vous n’avez jamais regretté cette décision ? 
Vous savez, je ne suis pas Salman Rushdie non plus ! À sa sortie, L’Évangile devait concourir à un prix littéraire européen, mais le gouvernement portugais a refusé d’y inscrire mon livre. J’ai trouvé ça stupide et je l’ai dit. Le problème a même été débattu au Parlement ! C’est alors que Pilar, ma femme, m’a suggéré que l’on fasse construire une maison à Lanzarote et qu’on parte vivre là-bas. Ma première réaction typique de mâle a été de répondre non. Ma deuxième réaction a été de dire : on va étudier la question. Ma troisième réaction, encore très masculine, a été de me réapproprier cette très bonne idée (rires). J’aime être là-bas, dans cette maison perdue au milieu de nulle part. Mais je n’ai jamais rompu avec mon pays d’origine. J’ai gardé une maison ici et j’y reviens souvent.

À quoi travaillez-vous actuellement ?
Mon dernier livre, Mes petits Mémoires, a été publié en décembre. Ce sont mes Mémoires reconstitués de mes 6 à 15 ans. Il est déjà sorti en Amérique du Sud, en Espagne, en Italie et devrait bientôt être traduit en français. Maintenant, j’ai une nouvelle idée. J’ai déjà commencé à prendre des notes, mais le moment de la rédaction n’est pas encore arrivé. Comme je le dis souvent, la première condition pour écrire c’est de s’asseoir. Bientôt arrivera cet instant délicieux de s’asseoir à une table et d’initier l’écriture. J’espère avoir terminé au printemps prochain. Ce ne sera ni du théâtre ni un essai...mais je ne veux pas en dire plus. Je peux seulement vous assurer qu’il s’agira d’un ouvrage difficile et aussi, peut-être, de mon dernier livre. Avec Mes petits Mémoires, c’est comme si une boucle avait été bouclée. Je croyais tenir là mon ultime livre et cela me rendait d’ailleurs très mal à l’aise. Maintenant, je sais qu’il y en aura un autre. À mon âge, ce n’est pas facile de se projeter dans l’avenir. À 70 ans, on peut encore dire « Quand j’aurai 80 ans...  ». Mais à 84 ans, que peut-on dire ?

« La mort ne vous concerne ni mort ni vif ; vif parce que vous êtes ; mort parce que vous n’êtes plus », écrivait Montaigne. Que représente la mort pour vous ? 
Comme je le répète souvent : pour vivre, il faut mourir. Mon père, ma mère, mon frère sont morts. Les faits sont les faits. On ne peut pas les contourner. Combien d’années me reste-t-il à vivre ? Trois, quatre, cinq ans ? Je n’ai pas peur de mourir, mais mon souhait serait de pouvoir écrire jusqu’au dernier jour. C’est par l’écriture que j’ai obtenu une place dans ce monde. Roger Martin du Gard disait : « Une belle vie vaut bien une belle œuvre. » J’ai la vanité de penser qu’à une belle œuvre, je peux ajouter une vie assez belle, marquée par une cohérence personnelle intègre. Un jour, l’essayiste portuguais Eduardo Lourenço a écrit que ma vie était un miracle. Je n’étais pas né pour avoir le prix Nobel. Je suis né dans une famille d’agriculteurs. J’aurais dû devenir paysan. Ma chance a été que mon père « émigre » à Lisbonne. Aujourd’hui, je suis content de mon travail et de ce que j’ai vécu. Je suis aussi très heureux d’avoir connu ma femme. J’avais 63 ans et elle 36 quand nous nous sommes rencontrés, ça a fait beaucoup jaser à l’époque. Mais c’est une femme formidable et aujourd’hui je peux témoigner que le bonheur existe."