Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

domingo, 7 de agosto de 2016

"Casa de José Saramago é boa pedida cultural nas Ilhas Canárias" de Luiza Sahd Colaboração para o UOL de Lanzarote (Ilhas Canárias)

Artigo de Luiza Sahd, para o UOL (Brasil) sobre a ligação de José Saramago e seu legado a Lanzarote, aqui 


"São raras as oportunidades de entrar em uma casa onde viveu algum grande artista sem que o ambiente tenha sido transformado para atender as necessidades estruturais de qualquer museu. A casa em que José Saramago viveu por 18 anos, onde escreveu seu "Ensaio sobre a Cegueira" e onde morreu serenamente em 2010 não só é aberta ao público como ainda é, de fato, uma casa.

O cenário escolhido pelo autor para morar é quase onírico: Lanzarote, nas Ilhas Canárias (Espanha), é parte de um arquipélago surpreendente não apenas por suas praias (algumas até de areia negra), como também por seus vulcões, montanhas, estradas cruzando mares de lava e vinícolas plantadas na pedra.

Quem visita a Casa José Saramago precisa consultar as horas em seu próprio relógio, pois todos eles marcam 16h em qualquer momento do ano. A homenagem se deve ao fato deste ter sido o horário em que Saramago conheceu a esposa, Pilar del Río, no dia 14 de junho de 1986.

As visitas são guiadas e feitas em diversos idiomas, incluindo o português. Quem mostra os detalhes do lar é Juan José, filho do primeiro casamento de Pilar. Na entrada, há uma oliveira -- xodó de Saramago --, que foi trazida de sua aldeia natal, Azinhaga (Portugal), em um voo comercial e entre as pernas do escritor.

A casa tem as paredes marcadas pelas paixões de Saramago: quadros pintados por artistas como os canários Joan Miquel Ramírez, Ildefonso Aguilar e César Manrique, retratos de Fernando Pessoa e Camões ainda com dois olhos e um tapete de pedra vulcânica da ilha. Também existem esculturas de diversas partes do mundo coletadas durante suas viagens e muitas fotografias de momentos marcantes, como a ocasião em que foi laureado com um Prêmio Nobel de Literatura, em 1998."

"Cadeira no jardim onde o escritor gostava de sentar para apreciar a ilha"
Fotografia de Luiza Sahd/UOL

"No jardim, a cadeira em que Saramago gostava de sentar para deixar as ideias fluírem permanece no mesmo lugar. Ainda é possível conferir a piscina onde o artista se exercitava nos fins de tarde. Do outro lado da rua, fica a biblioteca com seu acervo pessoal. Entre centenas de livros, muitos trazem dedicatórias comoventes de seus contemporâneos, como uma edição de "Cem Anos de Solidão" dedicada pelo amigo Gabriel García Marquez.

Ao fim da visita, há ainda o convite para beber o café português preferido de Saramago na cozinha onde aconteciam as animadas reuniões com figuras como Eduardo Galeano, Marisa Paredes, Pedro Almodóvar, Bernardo Bertolucci e Sebastião Salgado. Visita imperdível e inesquecível.

Casa de José Saramago
Quando: De segunda a sábado, das 10h às 14h (entrada permitida até às 13h30)
Onde: Calle Los Topes, 3, 35572, Tías
Mais informações: www.acasajosesaramago.com"

Crónica "Um regulamento a favor do fogo" em "As opiniões que o DL teve" (12 de Junho de 1972)

A presente crónica foi publicada faz 44 anos, escrita pelo punho de José Saramago. 
Enquando cronista na altura mostrava a sua preocupação e estranheza, hoje quando os rapazes da altura já são avós, recipero o carácter intemporal e a veracidade com que hoje nos deparamos nas consequências do desordenamento e falta de protecção da mancha florestal portuguesa. Isto obriga a uma preocupante reflexão - tal como ontem, hoje continuamos a ouvir falar de Oleiros e de povoações escondidas como Bogas de Baixo pelas piores razões. 
Rui Santos

"Um regulamento a favor do fogo" 12 de junho de 1972

"Com a chegada do verão, destes grandes calores que tornaram as matas e os pinhais inflamáveis como estopa, é certo e sabido que começam por esse país fora os incêndios. Devoram as encostas das serras, deixam-nas negras, despidas, terras de desolação onde, por muitos anos, se erguerão apenas os troncos queimados. Neste tempo se levantam inúmeras vozes a pedir proteção para o nosso património florestal, já de si tão escasso. A vulnerabilidade das nossas matas, se bem pensamos nela, é, a toda a hora, um convite à ruína total. Depois o tempo refresca, vem a chuva, adia-se a catástrofe para o ano. 
Na falta de um sistema de defesa eficiente, conta-se sempre com a dedicação e a ousadia das populações que, mal se ouve o sinal do fogo, correm montes e vales, gritando, ofegando, para irem atacar o incêndio, sem curarem de saber a quem pertencem as árvores que as chamas vão furiosamente destruindo. Acudir ao fogo é obrigação cívica a que ninguém foge, e não têm sido poucos os atos de grande coragem praticados nessas ocasiões, com total desinteresse, pois ninguém pensa em apresentar depois a fatura dos serviços prestados. Também não há veneras nem condecorações: estes episódios passam-se em serranias anónimas, longe das vistas da grande publicidade. 
Já os incêndios começaram a sua tarefa, e, lá para diante, não se passará um dia sem que o inferno lavre num ponto qualquer do País. E tudo será como de costume, e repetir-se-ão casos como este de que hoje falamos, acontecido numa povoação chamada Bogas de Baixo, próximo do Fundão. Ali, os sinos da igreja chamaram os habitantes ao combate. E foram todos, os novos e os velhos, as mulheres e as crianças. Fazia vento, e, como sempre acontece nessas circunstâncias, o fogo saltava do árvore em árvore, propagando-se pelas ramadas superiores, inutilizando os trabalhos no chão. Diante da ameaça cada vez maior, telefonou-se para povoações em redor e mais pessoas acorreram ao fogo, animando-se umas às outras, usando uma experiência já antiga, vinda de gerações. Por fim conseguiu-se travar o alastramento do incêndio. O desastre não foi total. 
E os bombeiros? Após algumas dificuldades de comunicação, e graças à intervenção de terceiras pessoas, foi possível chamar os da vila próxima. Também se recorreu aos serviços dos bombeiros de outra vila, a de Oleiros, mas o comandante destes disse que «não podia mandar deslocar os seus homens para concelho diferente, sem que o comandante dos bombeiros do concelho onde havia o sinistro os requisitasse». Segundo a fonte onde colhemos estas informações, o comandante de Oleiros mostrou-se «muito compreensivo», chegando a oferecer-se para um entendimento com o Fundão. Ficaram os combatentes Voluntários e paisanos à espera do que viesse, mas nada se conseguiu. Enquanto os pinheiros de Bogas de Cima ardiam, enquanto as gentes da terra se afadigavam a lutar por bens que só a poucos pertenciam, um artigo de regulamento impedia o auxílio que deveria poder ser dado por uma corporação de bombeiros, mas que não foi porque o concelho era outro... 
Estranhos casos se passam em Portugal! Muito mais estranhos ainda quando nos lembramos de que, durante a recente visita do presidente do Conselho a Castelo Branco, um dos mais brilhantes números dos festejos foi um longuíssimo desfile de bombeiros, com dezenas de viaturas. Vindos de muitos quilómetros e concelhos em redor... E não havia fogo." 

in, "Os Apontamentos"
Porto Editora, edição que compila 2 livros de crónicas
Páginas 54 e 55

Cia dos Náufragos estreia ‘A Ilha Desconhecida’, baseada em conto de José Saramago - Campinas SP Brasil (5 e 6 Agosto)

A notícia pode ser recuperada e acedida, aqui
em http://cartacampinas.com.br/2016/08/cia-dos-naufragos-estreia-a-ilha-desconhecida-baseada-em-conto-de-jose-saramago/



"Nos próximos dias 5 e 6 de agosto, sexta e sábado, a Cia dos Náufragos estreia seu novo espetáculo de teatro de rua “A Ilha Desconhecida”, baseado no conto homônimo do autor José Saramago, na Estação Cultura de Campinas.

O espetáculo reconta através de uma trupe de atores/marinheiros uma simples história: um Homem vai à procura da Ilha Desconhecida, com a convicção de que só se conheceria quando na ilha estivesse. Também é a história de uma Mulher que, por intermédio do destino, têm sua vida entrelaçada à do Homem. Uma inusitada jornada repleta de diversos obstáculos, um rei despótico e sua política de favores, ferozes burocratas, marinheiros incrédulos e uma inesperada companheira de viagem.

Uma alegoria da nossa busca pelo sentido do mundo e uma sátira da situação do mesmo. Livremente inspirada na obra de José Saramago.

A Cia dos Náufragos foi criada em 2012 na cidade de Campinas pelos atores formados no curso de Arte Cênicas da Unicamp Cristiane Taguchi, Miguel Damha, Renan Villela e pelo violonista, percussionista e compositor Rodrigo Lima. (Carta Campinas com informações de divulgação)

Ficha Técnica
A ILHA DESCONHECIDA, Cia dos Náufragos
DRAMATURGIA: O grupo, livremente inspirado no “Conto da Ilha Desconhecida” de José Saramago e A invenção de Ulisses, de Jorge de Lima
DIREÇÃO : Moacir Ferraz
ELENCO: Cristiane Taguchi, Miguel Damha, Renan Villela, Rodrigo Lima
PREPARAÇÃO VOCAL : Renan Villela
TRILHA ORIGINAL: Rodrigo Lima e Renan Villela
FIGURINO: Laura Françozo
CENOGRAFIA: Thalita Castro
CENOTECNICA: Erico Daminiele
ARTE GRAFICA: Renan Villela
FOTOGRAFIA: Maycon Soldan

A Ilha Desconhecida, Cia dos Naufragos
Data: 05/08 às 20h, 06/08 às 17h
Local: Estação Cultura – Praça Mal Floriano Peixoto, Campinas – SP
Entrada gratuita"