"O desbarato mais absurdo não é o dos bens de consumo, mas o da humanidade: milhões e milhões de seres humanos nasceram para ser trucidados pela História, milhões e milhões de pessoas que não possuíam mais do que as suas simples vidas. De pouco ela lhes iria servir, mas nunca faltou quem de tais miuçalhas tivesse sabido aproveitar-se. A fraqueza alimenta a força para que a força esmague a fraqueza.
Parece haver em mim como uma balança interior, um padrão aferidor que me tem permitido vigiar, de uma maneira a que chamaria intuitiva, a «economia» dos por-menores narrativos. Em princípio, o «eu lógico» não recusa nenhuma possibilidade, mas o «eu intuitivo» rege-se por umas leis próprias que o outro aprendeu a respeitar, mesmo quando tem relutância em obedecer-lhes. Evidentemente, não há aqui nenhuma ciência, salvo se este aspecto tão particular do meu trabalho se nutre de uma outra espécie de ciência, involuntária, infusa, inlocalizável, que, mero prático que sou, me limito a seguir, como quem se vai apercebendo da mudança das estações sem nada saber de equinócios e solstícios."
in, "Cadernos de Lanzarote - Diário II"
Caminho, página 57 (24/02/1994)
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