Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

quinta-feira, 3 de março de 2016

"Jogo do Lenço" Poema de José Saramago declamado por Maria do Céu Guerra ("Os Poemas Possíveis", 1966)

Pode ser visualizado, via YouTube, aqui

"Poema do Livro "Provavelmente Alegria" de José Saramago, dito por Maria do Céu Guerra, incluido na homenagem que o PCP lhe fez por ocasião do 10.º aniversário da atribuição do Prémio Nobel da Literatura."

"Jogo do Lenço"

"Trago no bolso do peito 
Um lenço de seda fina, 
Dobrado de certo jeito. 
Não sei quem tanto lhe ensina 
Que quanto faz é bem feito. 

Acena nas despedidas, 
Quando a voz já lá não chega 
Por distâncias desmedidas. 
Depois, no bolso aconchega 
As saudades permitidas. 

Também o suor salgado, 
Às vezes, enxugo a medo, 
Que o lenço é mal empregado. 
E quando me feri um dedo, 
Com ele o trouxe ligado. 

Nunca mais chegava ao fim 
Se as graças todas dissesse 
Deste meu lenço e de mim, 
Mas uma coisa acontece 
De que não sei porque sim: 

Quando os meus olhos molhados 
Pedem auxílio do lenço, 
São pedidos escusados. 
E é bem por isso que penso 
Que os meus olhos, se molhados, 
Só se enxugam no teu lenço."


José Saramago, 
in, "Os Poemas Possíveis", 1966 

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