(imagem alusiva à personagem Blimunda, do "Memorial do Convento, alimentando-se e assim evitando, "ver por dentro" de Baltasar)
(...) O personagem central da história é outra vez uma mulher. Suponho que às minhas leitoras lhes agradará que isto seja uma constante, porque verdadeiramente, como personagens, quem sempre salva os meus livros são as mulheres. Não é que os homens não sejam pessoas boas, que o são e podem sê-lo, mas ao lado delas aparecem sempre como pequenos aprendizes. Quero clarificar algo que já assinalei antes, a propósito do facto de não se encontrarem heróis nos meus romances, apenas gente normal, que vive vidas normais, embora no caso de Baltasar e Blimunda eles assistam com naturalidade a certos prodígios. Reflicto e escrevo sobre pessoas comuns porque essa é a gente que conheço. É provável que as mulheres que invento não existam, talvez não sejam mais do que projectos, talvez me seja mais fácil imaginar um projecto de mulher que um projecto de homem. Em qualquer caso, e para não fugir à questão, acrescentarei o facto de ter sido criado por mulheres, de viver e crescer sempre entre mulheres, pressupôs, em definitivo, ter aprendido com elas o que efectivamente é benéfico, não no sentido utilitário, mas em profundidade e humanismo. Devo isto às mulheres e, por isso, assim fica reflectido nos meus livros. (...)
em, "A Estátua e a Pedra
Fundação José Saramago
Página 35
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