Declaração Pública de José Saramago
"O que fez Aminatou Haidar, ao colocar em risco a sua própria vida tem de servir para despertar a comunidade internacional para um problema que já deveria ter sido resolvido há muitos anos", disse José Saramago depois de se encontrar com Aminatou Haidar, no Aeroporto de Lanzarote, onde se encontra extremamente fragilizada.
O Prémio Nobel da Literatura José Saramago pediu, à ONU "que imponha a Marrocos o cumprimento das suas resoluções sobre o Sahara Ocidental".
José Saramago, no Aeroporto de Lanzarote, afirmando pessoalmente a sua solidariedade para com a resistente saharaui, Aminatou Haidar. Na altura estava em greve de fome, depois de lhe ter sido recusada a entrada em Aaiún, capital do Sahara Ocidental ocupado.
Carta aberta, redigida por José Saramago à activista
"Se estivesse em Lanzarote, estaria contigo.
Não porque seja um militante separatista, como te definiu o embaixador de Marrocos, mas precisamente pelo contrário. Acredito que o planeta a todos pertence e todos temos o direito ao nosso espaço para poder viver em harmonia. Creio que os separatistas são todos aqueles que separam as pessoas da sua terra, as expulsam, que procuram desenraizá-las para que, tornando-se algo distinto do que são, eles possam alcançar mais poder e os que combatem percam a sua auto-estima e acabem por ser tragados pela irracionalidade.
Marrocos em relação ao Sahara transgride tudo aquilo que são as normas de boa conduta. Desprezar os Saharauis é a demonstração de que a Carta dos Direitos Humanos não esta enraizada na sociedade marroquina, que não se rebela com o que se faz ao seu vizinho, e que é a prova de que Marrocos não se respeita a si próprio – quem está seguro do seu passado não necessita expropriar quem lhe está próximo para expressar uma grandeza que ninguém jamais reconhecerá. Porque se o poder de Marrocos alguma vez acabasse por vergar os saharauis, esse pais admirável por muitas e muitas coisas, teria obtido a mais triste vitoria, uma vitoria sem honra, nem glória, erguida sobre a vida e os sonhos de tanta gente, que apenas quer viver em paz na sua terra, em convivência com os seus vizinhos para que, em conjunto, possam fazer desse continente uma lugar mais feliz e habitável.
Querida Aminetu Haidar,
Dás um exemplo valioso em que todas as pessoas e todo o mundo se reconhecem. Não ponhas em risco a tua vida porque tens pela frente muitas batalhas e para elas és necessária. Os teus amigos, e os amigos do teu povo, defender-te-mos em todos os foros que forem necessários.
Ao Governo de Espanha pedimos sensibilidade. Para contigo, e para com o teu povo. Sabemos que as relações internacionais são muito complexas, mas há muito anos que foi abolida a escravidão tanto para as pessoas como para os povos. Não se trata de humanitarismo, as resoluções das Nações Unidas, o Direito Internacional e o senso comum estão do lado certo, e em Marrocos e em Espanha disso se sabe.
Deixemos que Aminetu regresse a sua casa com o reconhecimento do seu valor, à luz do dia, porque são pessoas como ela que dão personalidade ao nosso tempo e sem Aminetu todos, seguramente, seriamos mais pobres.
Aminetu não tem um problema. Um problema tem seguramente Marrocos. E pode resolvê-lo… terá que resolvê-lo. Não se trata apenas de um problema de uma mulher corajosa e frágil, mas sim o de todo um povo que não se rende já que não entende nem a irracionalidade nem a voracidade expansionista, que caracterizavam outros tempos e outros graus de civilização.
Um abraço muito forte, querida Aminetu Haidar
José Saramago"
Aminatou Haidar (Izquierda) abraza a la periodista y viuda de José Saramago, Pilar del Río, que recogió en Sevilla el Premio a la Solidaridad Juan Antonio González Caraballo, otorgado al escritor portugués.
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