"A transformação social. A contestação. Personagens em diálogos. As cruentas desigualdades sociais. Surgem as perguntas proibidas. Vai-se adquirindo consciência e espaço, para que tudo se levante do chão. Um livro composto por 34 capítulos. No 17.º está a tortura e a morte de Germano Santos Vidigal. Germano, o nome que significa irmão, o homem da lança. Apesar de vencido, o sacrifício da sua vida indica o caminho. «Já o encontraram. Levam-no dois guardas, para onde quer que nos voltemos não se vê outra coisa, levam-no da praça, à saída da porta do setor seis juntam-se mais dois, e agora parece mesmo de propósito, é tudo a subir, como se estivéssemos a ver uma fita sobre a vida de Cristo, lá em cima é o calvário, estes são os centuriões de bota rija e guerreiro suor, levam as lanças engatilhadas, está um calor de sufocar, alto.»As mulheres são também chamadas à primeira linha das decisões neste belo romance de Saramago. O diálogo monossilábico entre marido e mulher da família Mau-Tempo vai-se alterando. Interessante observar uma narrativa que vai da submissão ao sentido de libertação, através de gerações."
A obra "Levantado do Chão", ou dos dias em que gerações de homens e mulheres, viveram a pobreza do campo. As lutas, as vidas, as cores e cheiros alentejanos, na visão de José Saramago. Destas agruras de um povo, nasce uma voz, coral, o "Cante Alentejano"
(O artista albanês, Saimir Strati está a construir o maior mosaico em rolhas de cortiça do Mundo em Ponte Sor, no Centro de Artes e Cultura.)
"São sete ou oito grupos de perto e longe. Cantam os trabalhos e os dias, os amores e as paisagens.
Estão duas mil pessoas a ouvi-los pela noite fora, em silêncio, só aplaudindo no fim de cada canção, à entrada de cada grupo, mas neste caso quase nada, porque é sabido que mal se podem bater palmas quando os homens começam a mover-se, lentamente, naquele movimento pendular dos pés, que parecem ir pousar onde antes haviam estado, e no entanto avançam.
O tenor lança os primeiros versos, o contratenor levanta o tom, e logo o coro, maciço como o bloco dos corpos que se aproximam, enche o espaço da noite e do coração. O viajante tem um nó na garganta, a ele é que ninguém poderia pedir-lhe que cantasse. Mais facilmente fecharia os punhos sobre os olhos para não o verem chorar."
José Saramago, "Viagem a Portugal"
Publicado no Facebook, da Fundação José Saramago,
em https://www.facebook.com/fjsaramago?fref=photo
(imagem das ceifeiras alentejanas, onde no trabalho braçal do campo,
as mulheres tinham autorização para cantar as modas)
Menção identificativa, do "Cante Alentejano" no site da Unesco
http://www.unesco.org/culture/ich/index.php?lg=en&pg=00011&RL=01007
"Cante Alentejano is a genre of traditional two-part singing performed by amateur choral groups in southern Portugal, characterized by distinctive melodies, lyrics and vocal styles, and performed without instrumentation. Groups consist of up to thirty singers divided into groups. The ponto, in the lower range, starts the singing, followed by the alto, in the higher range, which duplicates the melody a third or a tenth above, often adding ornaments. The entire choral group then takes over, singing the remaining stanzas in parallel thirds. The alto is the guiding voice heard above the group throughout the song. A vast repertoire of traditional poetry is set to existing or newly created melodies. Lyrics explore both traditional themes such as rural life, nature, love, motherhood and religion, and changes in the cultural and social context. Cante is a fundamental aspect of social life throughout Alentejano communities, permeating social gatherings in both public and private spaces. Transmission occurs principally at choral group rehearsals between older and younger members. For its practitioners and aficionados, cante embodies a strong sense of identity and belonging. It also reinforces dialogue between different generations, genders and individuals from different backgrounds, thereby contributing to social cohesion."
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