Dia 26 de Janeiro de 1996, José Saramago apresenta os agradecimentos pela atribuição do Prémio Camões, em discurso perante o presidente do Brasil - Fernando Henrique Cardoso.
Dia 27 de Janeiro de 1996, os "Cadernos de Lanzarote - Diário IV" abrem espaço ao "Diário de viagem de Pilar"
27 de Janeiro de 1996
"De noites doces todos temos experiência. Agora, noites doces propriamente ditas, sem metáforas nem segundos sentidos, não devem ser tão frequentes assim, uma vez que nem toda a gente adormece com um bombom na boca." (...) "Nunca um bombom durou tanto nem uma noite foi tão doce. Propriamente falando."
28 de Janeiro de 1996
"A outra Brasília existe e hoje conhecemo-la." (...) "Eric Nepomuceno e Marta, sua mulher, levaram-nos a almoçar na margem de um lago que me tinha esquecido haver ali." (...) "À noite, Maria Lúcia Verdi (...) reuniu em sua casa um grupo de amigos do mundo da cultura e da política cultural, incluindo o ministro. Ceia amável com surpresa no fim: Roberto Correa, um músico amigo de Maria Lúcia, compositor e investigador de sons indígenas e populares, ofereceu um recital (...)
29 de Janeiro de 1996
"A manhã foi dedicada por José Saramago a atender os meios do comunicação social, que queriam saber do Prémio Camões tanto como do Ensaio sobre a Cegueira" (...) "Ao meio-dia, almoço em casa dos embaixadores portugueses, Maria Fernanda e Pedro Ribeiro Meneses." (...) "Emocionada" (...) À noite, palestra no Centro Cultural da Embaixada, um salão grande que se encheu para conversar sobre literatura. José falou de Camões, quando ele, conforme o conta em Que Farei com Este Livro?, tentava publicar Os Lusíadas, com tantos trabalhos como pouca fortuna." (...)
Dia da entrega do Prémio Camões. Tanta gente ilustre e amiga.
(...) "A sala estava cheia de ilustres. Ilustres do mundo da cultura" (...) "Foi uma cerimónia de palavras." (...) "Depois da cerimónia, simpaticamente, o presidente ofereceu um almoço de confraternização que resultou interessante." (...) "um dia de glória bendita, no sentido que damos em Andaluzia a esta expressão: de bonança acolhedora, de amigos felizes que compartilham a mesma alegria e o mesmo anseio de expressar ideias e sentimentos num idioma comum que os une e singulariza, que os torna irrepetíveis, necessários e úteis." (...)
31 de Janeiro de 1996
"Viajámos para São Paulo deixando atrás amigos que se multiplicaram em atenções." (...) "Esta noite paulista foi para falar da Europa e de Portugal. No auditório do Museu de Arte de São Paulo, uma conferência para explicar as dificuldades (e os motivos delas) que Portugal teve ao longo do tempo da história para acertar o seu relógio com o tempo." (...)
1 de Fevereiro de 1996
"Se se quiser sobreviver em Salvador da Bahia, o melhor é não ir jantar com Caetano Veloso, porque até as pedras das rua , como se não fossem suficientes as multidões (benditas multidões) que as povoam, querem saudá-lo." (...)
(...) "Iemanjá é o nome da deusa do mar. Todos os anos, no seu dia, os pescadores, os habitantes de Salvador lhe entregam presentes" (...) Ao cair da tarde, forma-se uma procissão de barcos que, ordenadamente, navegam até um ponto determinado, mar dentro, onde se realizar a oferenda" (...) Seguimos a festa no terraço de Caetano Veloso" (...)
(...) "Assim são as coisas nesta parte do mundo, onde o importante não é o que se vende e o que se compra, mas sim sabermo-nos vivos, ao menos por hoje, donos absolutos do tempo" (...) "A casa do Rio Vermelho, que começou por ser o cenário onde se desenrolaria parte da vida dos protagonistas Zélia e Jorge, erigiu-se em estrela de si mesma, estrela de carácter" (...) "Rodeia-a uma pequena selva domesticada, minúscula se a compararmos com a Amazónia, mas imensa para os nossos europeus e surpreendidos olhos." (...) "A Fundação Jorge Amado está no Pelourinho, zona de Salvador considerada património da Humanidade pela UNESCO, paisagem dos livros de Amado." (...) "Almoçámos perto do Pelourinho, na Casa de Dadá, um dos restaurantes preferidos dos nossos amigos" (...) "O dia terminou em Santo Amaro, onde, como diziam os autocolantes que as pessoas levavam e que conservamos, «vi e ouvi Caetano em Santo Amaro»." (...)
4 de Fevereiro de 1996
"Custa-nos deixar a Bahia" (...) "O Rio de Janeiro recebeu-nos com uma chuva de Verão, dessas implacáveis que aparecem e desaparecem sem aviso prévio" (...) "O serão deste domingo estava reservado para outro encontro de velhos amigos, admirados companheiros de letra de José. Chico Buarque foi o anfitrião da noite, que começou em sua casa e terminou num restaurante italiano, onde, pelo mimo com que o tratam, é cliente principal, Rubem Fonseca, João Ubaldo Ribeiro e Berenice, Eric Nepomuceno e Martha, Luiz e Lili, eram os outros comensais, reunidos por umas letras que tantas vezes separam e que são tão poderosas quando criam laços de amizade." (...) "De regresso a Copacabana passámos por Ipanema" (...)
"José, como escritor e Prémio Luís de Camões, era o convidado de honra da inauguração oficial de um edifício destinado a altos fins: o Palácio do Livro." (...) "Pela tardinha, nos jardins da Biblioteca Nacional, palestra de José" (...)
(...) O último acto público de José era uma conferência nas instalações de O Globo, que de manhã havia publicado uma entrevista ilustrada com uma fotografia da cabeça de José, maior que o tamanho natural. Quase teve um desmaio quando a viu O título da conferência era «O Escritor perante o Racismo»." (...)
7 de Fevereiro de 1996
"Foi uma sorte ter o Ministério da Cultura reservado lugares para viajar para Madrid às 7 da noite" (...) "No almoço do consulado tinha estado, nem mais nem menos, Oscar Niemeyer, com quem José se encontra algumas vezes, mas sempre de maneira rápida e superficial" (...) "A caminho do aeroporto voltou a cair o dilúvio. chuva como cataratas" (...) "Na verdade, uma parte de nós já tinha ficado no Brasil, A outra parte também se a chuva tivesse ajudado..."
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