Referências mais antigas, recolhidas numa crónica baseada em algumas entrevistas que José Saramago concedeu ao jornal regional "Jornal das Caldas"
Aqui o link da publicação, em http://jornaldascaldas.com/
"Nos primeiros meses de existência do JORNAL DAS CALDAS, em 16 de Julho de 1992 publicámos uma entrevista a José Saramago, numa altura em que tinha acabado de receber o Grande Prémio de Romance da Associação Portuguesa de Escritores.
Na altura explicava a sua assiduidade de publicações:
“Há duas coisas que é preciso ter sempre em conta naquilo que temos de fazer, na vida ou onde for. Uma delas é não ter pressa e outra é não perder tempo. Parecem duas declarações contraditórias, e eventualmente o são, mas a verdade é que há coisas que precisam de um tempo para puderem amadurecer, mas também não podemos ficar com a ideia de que o tempo que temos de vida é suficiente para tudo”.
“Há duas coisas que é preciso ter sempre em conta naquilo que temos de fazer, na vida ou onde for. Uma delas é não ter pressa e outra é não perder tempo. Parecem duas declarações contraditórias, e eventualmente o são, mas a verdade é que há coisas que precisam de um tempo para puderem amadurecer, mas também não podemos ficar com a ideia de que o tempo que temos de vida é suficiente para tudo”.
E prevendo um dia já não ter tempo, declarou:
“Tenho 69 anos, o tempo que eu tenho para viver não é tanto que eu possa perder”.
“Tenho 69 anos, o tempo que eu tenho para viver não é tanto que eu possa perder”.
Ainda teria pela frente mais 18 anos e muitas obras e sucessos, o principal dos quais a distinção como Prémio Nobel da Literatura.
O escritor falava também na ocasião do orgulho por ver as suas obras traduzidas em várias línguas. “A primeira vez que sucede é um deslumbramento. Ficamos felicíssimos, como é o caso da primeira entrevista que se dá, o caso da primeira pessoa que encontramos a ler um livro nosso ou quando o vemos na montra de uma livraria. Tudo o que acontece pela primeira vez é realmente um choque, como é ver o nosso primeiro livro traduzido. Só nesse dia nos apercebemos ter passado a fronteira para o lado de lá. Mas depois começam a ser tantas as traduções, desde o japonês ao hebraico, do sueco ao finlandês, do alemão até ao grego, que já não é aquela emoção. Posso dizer é existirem dois tipos de satisfação, uma é a satisfação pessoal, outras é menos egoísta e tem a ver com a nossa terra, língua e cultura, e é através do escritor que a Literatura Portuguesa chega ao lado de lá. Eu não me lembro de ter sentido uma emoção tão forte como em Milão ouvir um cantor lírico italiano dizer a palavra Portugal”, manifestou.
A relação polémica de Saramago com a Igreja (que teve o expoente máximo com a obra “O Evangelho Segundo Jesus Cristo”) também foi comentada pelo escritor:
“Estou perfeitamente consciente que a Igreja não gosta. Não pode gostar, de facto. Respeito as suas convicções sob condição de que respeitem as minhas e o direito que tenho de escrever sobre o que entender, da forma que entender”. E adiantou: “A primeira carta que eu recebi foi de um bispo fundamentalista, em que ele começa dizendo: ‘Isto não é uma ameaça’; e acabava assim: ‘Não por fanatismo mas em nome da justiça, o senhor devia ser condenado à morte sem sepultura’. Para que as coisas não fossem tão dolorosas, ele fechava a carta dizendo: ‘Rezo por si!’”.
“Estou perfeitamente consciente que a Igreja não gosta. Não pode gostar, de facto. Respeito as suas convicções sob condição de que respeitem as minhas e o direito que tenho de escrever sobre o que entender, da forma que entender”. E adiantou: “A primeira carta que eu recebi foi de um bispo fundamentalista, em que ele começa dizendo: ‘Isto não é uma ameaça’; e acabava assim: ‘Não por fanatismo mas em nome da justiça, o senhor devia ser condenado à morte sem sepultura’. Para que as coisas não fossem tão dolorosas, ele fechava a carta dizendo: ‘Rezo por si!’”.
Saramago, nessa entrevista ao JORNAL DAS CALDAS, conduzida por José Patrício, concluía: “Um escritor não se define, espera que os outros o façam”.
A 14 de Outubro de 1998, o JORNAL DAS CALDAS tinha motivos mais do que suficientes para falar do escritor. Tinha sido contemplado com o Nobel e o jornalista Luís Pires escrevia que “Saramago é um provocador. Apesar da sua aparência serena, imagino como se ri cada vez que termina um novo romance que sabe perfeitamente ir entrar no pensamento dos leitores e revolucionar todos os seus conceitos”.
Duas semanas depois, a propósito da vinda de Saramago às Caldas da Rainha, a convite da livraria Loja 107 para uma sessão de autógrafos, tendo a autarquia aproveitado para lhe entregar a Medalha de Honra do Município, Luís Pires comentava: “O povo português é de extremos. É capaz de criticar mortalmente qualquer acontecimento ou pessoa, e a seguir, perante algo bom que aconteça, levar em braços os responsáveis, criar canções de homenagem e quase chorar, sentindo cada alegria como se fosse conseguida por si individualmente. Saramago é o mais recente exemplo desse peculiar ‘orgulho de ser português’”.
Recordando declarações proferidas na ocasião, o presidente da Câmara, Fernando Costa, afirmava que o admirava o escritor por ser “um homem que luta toda a vida por princípios nos quais acredita”.
Já o escritor explicava que o Prémio Nobel “reforçou-nos a auto-estima”. E defendia: “Temos que pôr em movimento uma política efectiva de defesa da língua portuguesa. Se houver realmente um esforço coerente, este prémio, além da satisfação que deu, irá servir para que a nossa língua ganhe força”.
A atribuição da Medalha de Honra foi feita após aprovação da Câmara e da Assembleia Municipal das Caldas da Rainha. Marcelo Morgado, da bancada do PSD na Assembleia Municipal, disse, em nome pessoal, discordar da atribuição da medalha, considerando que o laureado “agride-me profundamente por uma questão ética, pois não me esqueço que foi também um escritor político e que foi durante o PREC o saneador dos jornalistas do Diário de Notícias, e se isso só não bastasse, vi-o num espectáculo na cidade do Porto a abraçar o senhor presidente do Governo de Cuba (Fidel Castro), um homem que tem tantos crimes políticos no bolso como tem o senhor Pinochet”. Não impedindo uma aprovação por unanimidade, o deputado ausentou-se da sala na altura da votação.
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