Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

quinta-feira, 28 de maio de 2015

Resenha da obra "Alabardas, Alabardas, Espingadas, Espingardas" no blog "Literar"

Via página do Facebook da Fundação José Saramago, aqui
em https://www.facebook.com/fjsaramago?fref=nf

«Uma crítica a "Alabardas, alabardas, Espingardas, espingardas" publicada pelo blog Literar, do Brasil: "Pode parecer estranho publicar um livro incompleto, mas essa é justamente a graça de toda a obra de Saramago: o futuro está aí para ser escrito, todos os dias, o tempo todo."»



Link do blog "Literar" (Brasil), aqui em http://www.literar.com.br/
Link da resenha da obra, via blog "Literar", aqui para consulta e leitura 
em http://www.literar.com.br/alabardas-alabardas/


«Na minha cabeça, algumas pessoas são imortais. Eu sei, eu sei: a vida tem etapas, e morrer faz parte desse processo natural. Racionalmente, eu sei (mas vai dizer isso para aquela parte de mim que espera que Manuel Bandeira, Ariano Suassuna e Gabriel García Marquez estejam sempre por aqui). Para minha felicidade completa, minha teoria às vezes se prova certa. Mais de três anos após deixar milhares de órfãos pelo mundo, José Saramago volta a bater na minha porta com Alabardas, Alabardas, Espingardas, Espingardas. O que eu poderia fazer senão tirar a tranca do portão e convidá-lo para um chá com bolachas?

Alabardas, Alabardas… é o último romance escrito por Saramago, com um porém: o escritor se foi antes que pudesse terminá-lo. Na verdade, o que temos nas páginas publicadas pela Companhia das Letras são os três capítulos iniciais da obra, acompanhados de anotações feitas por José sobre o caminho que pretendia seguir daí para frente. Parece pouco, né? E em certo ponto, é mesmo. É pouco porque as palavras de Saramago tem o efeito de te abraçar com força logo nos primeiros parágrafos. Depois de conhecer seus personagens, é difícil aceitar que não vamos acompanhá-los até o final de suas jornadas. Por outro lado, o romance cumpre o papel essencial de um livro: colocar a imaginação para trabalhar a todo vapor. Se não há final, há páginas e páginas em branco para que novos destinos surjam na cabeça de quem lê.


O livro nos introduz a Artur Paz Semedo, trabalhador de uma indústria armamentista e defensor da arte da guerra, e sua ex-mulher Felícia, uma pacifista convicta que acabou rompendo seu casamento por não acreditar na ideologia do marido. Em um livro sobre a Guerra Civil Espanhola, Artur lê um trecho que lhe chama a atenção: em determinado local, funcionários do setor de armas sabotaram materiais que seriam usados na guerra. Impulsionado por esse fato, ele decide pesquisar, dentro da empresa que trabalha, os históricos referentes a essa época e tentar descobrir se algo similar se passou também por lá.

Além dos três capítulos, o livro traz ilustrações incríveis de Günter Grass, alemão ganhador do Nobel de literatura, e três ensaios sobre a obra de Saramago. Escritos por Fernando Gómez Aguilera, Luiz Eduardo Soares e Roberto Saviano, os textos formam um complemento importante para entender a importância dessas últimas páginas de um dos maiores escritores que o mundo conheceu. Pode parecer estranho publicar um livro incompleto, mas essa é justamente a graça de toda a obra de Saramago: o futuro está aí para ser escrito, todos os dias, o tempo todo.

Se eu precisasse tirar uma única lição de toda a obra de José Saramago, seria: o mundo é feito de pessoas. Pessoas que pensam, se relacionam e comunicam. Pessoas que não tem ideia de todo o potencial que se esconde por trás de seus dia-a-dia monótonos. Pessoas que desconhecem a mágica por trás de suas histórias mundanas e seus relacionamentos. Por isso, não, eu não acho estranho ler seu último livro e nunca saber como ele termina. Afinal, Saramago me ensinou a ver além, a enxergar mais do que se vê.



Com Alabardas, Alabardas… Saramago entrou na minha casa, deixou o casaco no cabineiro, provou do chá e pediu por uma colher de açúcar, mas teve que ir embora antes dos biscoitos saírem do forno. Fica tranquilo, Saramago, seu lugar na mesa vai estar sempre separado – e eu mando fazer um pacote especial com as guloseimas ainda quentinhas. Palavra de amigo. ;)»
Luiz Marcatto

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