Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Citador #7 - a desumanização do homem, a imposição da crueldade, a bestialidade

Citador #7
A desumanização do homem, a imposição da crueldade, a bestialidade



em, "A Estátua e a Pedra
Fundação José Saramago
Página 34

" Não somos capazes de reconhecer que foi o ser humano quem inventou algo tão alheio à natureza como a crueldade. Nenhum animal é cruel, nenhum animal tortura outro animal. Têm de seguir as leis impostas pela vontade de sobreviver, mas torturar e humilhar os seus semelhantes são invenções da razão humana."

O feminino no universo de Saramago, pelas suas palavras



(imagem alusiva à personagem Blimunda, do "Memorial do Convento, alimentando-se e assim evitando, "ver por dentro" de Baltasar)


(...) O personagem central da história é outra vez uma mulher. Suponho que às minhas leitoras lhes agradará que isto seja uma constante, porque verdadeiramente, como personagens, quem sempre salva os meus livros são as mulheres. Não é que os homens não sejam pessoas boas, que o são e podem sê-lo, mas ao lado delas aparecem sempre como pequenos aprendizes. Quero clarificar algo que já assinalei antes, a propósito do facto de não se encontrarem heróis nos meus romances, apenas gente normal, que vive vidas normais, embora no caso de Baltasar e Blimunda eles assistam com naturalidade a certos prodígios. Reflicto e escrevo sobre pessoas comuns porque essa é a gente que conheço. É provável que as mulheres que invento não existam, talvez não sejam mais do que projectos, talvez me seja mais fácil imaginar um projecto de mulher que um projecto de homem. Em qualquer caso, e para não fugir à questão, acrescentarei o facto de ter sido criado por mulheres, de viver e crescer sempre entre mulheres, pressupôs, em definitivo, ter aprendido com elas o que efectivamente é benéfico, não no sentido utilitário, mas em profundidade e humanismo. Devo isto às mulheres e, por isso, assim fica reflectido nos meus livros. (...)

em, "A Estátua e a Pedra
Fundação José Saramago
Página 35

Citador #6 - Marçal Gacho e o seu uniforme de guarda do Centro



Citador #6
«A Caverna»
Caminho
Página 14

(...) "Conhecesse-a Marçal Gacho, que talvez fizesse valer perante o sogro o peso da autoridade que a farda lhe conferia, conhecesse-a Cipriano Algor, que talvez passasse a falar ao genro com menos irónica condescendência. É bem verdade que nem a juventude sabe o que pode, nem a velhice pode o que sabe." (...)


(desenho de homens escravizados)

Pinacoteca Nacional de Bolonha onde Saramago recolhe material para "O Evangelho segundo Jesus Cristo"

(...) O "Evangelho segundo Jesus Cristo", dizia, é o romance que gerou mais polémica e é a causa de ter mudado a minha residência de Lisboa para Lanzarote, em Espanha. É um livro que não projectei, porque jamais me havia passado pela cabeça escrever uma vida de Jesus, havendo tantas e sendo tão diferentes as interpretações que dessa vida se fizeram, destrutivas por vezes, ou, pelo contrário, obedecendo às imposições restritivas do dogma e da tradição." (...)



Atente-se, nestas anteriores palavras. Refere abertamente que a sua vida sofreu perturbações e mudanças após a publicação da obra (que o leva a deixar a vida normal e fixa em Lisboa, passando a habitar em Lanzarote), ao mesmo tempo que recorda a sua prévia reticência em abraçar a idealização e esquematização da sua interpretação da vida de Jesus.
Esta reticência, e porque ao tocar nela, com uma visão não alinhada, não seguidista, abalroando os dogmas e evidenciando o seu cepticismo perante a interpretação das diversas "escrituras", Saramago, comprou uma guerra.
É minha interpretação, que José Saramago teria a convicção de que a "Igreja", enquanto organização o ignoraria, desprezaria-o, ao mesmo tempo que alguns sectores mais radicais, quais defensores e cruzados, lançariam umas "alfinetadas" aqui e ali. A este propósito confidencia a José Carlos de Vasconcelos, que o livro é capaz de dar um editorial na Rádio Renascença.
Mas, talvez tenha sido apanhado de surpresa, ou não estivesse preparado para uma agressão e censura, perpetrada pelas mais altas figuras do "Estado" português.
Este "Estado" de origem Republicana e Laica, assumia ao mais alto nível que o "Evangelho segundo Jesus Cristo" seria um livro blasfemo, censurável pela sua visão desalinhada com o Vaticano e "bispos" de Lisboa. 
A história e repercussão que a mesma teve, é por demais conhecida, e Saramago refere que depois de muito se discutir esta questão... tudo ficaria na mesma. 
Ouso pensar, que pela sua cabeça, deverão ter ressoado estas palavras: «É tempo de dizer, um até já e fiquem a falar sozinhos...»
Prossegue.



(...) "Simplesmente, o homem põe e a circunstância dispõe e aqui está o que me impeliu a uma tarefa cuja complexidade ainda hoje me assusta: Estava em Sevilha, ia ao encontro de Pilar, minha mulher, e, atravessando a Praça da Campana em direcção à Rua Sierpes, li, ao longe num quiosque de jornais que mais tarde vim a saber era conhecido como o Quiosque de Curro, entre a confusão de jornais e revistas expostos numa lateral, e escrito num português do mais nítido que possa ver-se, estas palavras: «O Evangelho segundo Jesus Cristo». Olhei e segui em frente, atravessei a rua, e dez metros mais à frente, Rua Sierpes adentro, detive-me e disse a mim próprio que aquilo não era possível, que tal coisa não podia existir, de modo que voltei atrás para acabar por comprovar que nem em português, nem em espanhol, nem em italiano, nem em nenhuma outra língua do mundo estava a palavra «Evangelho», nem a palavra «Jesus», nem a palavra «Cristo» (...)
(...) Durante cerca de um ano andei com aquele pressentimento de livro, sentia que deveria ser o seguinte trabalho mas não encontrava a ponta do fio por onde lhe poderia pegar. E aconteceu que, passados meses, fui a Itália e na Pinacoteca de Bolonha, entrando na segunda ou na terceira sala à esquerda, de repente vi todos os pontos de apoio de que precisava para escrever o livro. Depois foi o tempo do trabalho, e o romance está aí e por aí circula.
Com este livro terminou a "estátua". A partir de "O Evangelho segundo Jesus Cristo", e isto sei-o agora que o tempo passou, começou outro período da minha vida de escritor. (...)
(...) Quando terminei "O Evangelho" ainda não sabia que até então tinha andado a escrever estátuas. Tive de entender o novo mundo que se me apresentava ao abandonar a superfície da pedra e passar para o seu interior, e isso aconteceu com o "Ensaio sobre a Cegueira". Percebi, então, que alguma coisa tinha terminado na minha vida de escritor e que algo diferente estava a começar. (...)

em, "A Estátua e a Pedra
Fundação José Saramago
Páginas 32 a 34


Brilhante menção à Pinacoteca Nazionale di Bologna, aqui o site em http://www.pinacotecabologna.beniculturali.it/, onde José Saramago, descobriu as diversas fontes para que pudesse pegar nas pontas do seu projecto.

"La Pinacoteca  
La Pinacoteca Nazionale di Bologna ha sede nella zona universitaria, nello stesso edificio storico che ospita l’Accademia di Belle Arti e la Soprintendenza per il Patrimonio Storico Artistico ed Etnoantropologico di Bologna, così da costituire un complesso dove si fondono esposizione, tutela, conservazione e studio del patrimonio storico artistico cittadino e regionale.
Con le sue trenta sale espositive, ed uno spazio adibito esclusivamente alle mostre temporanee ed alla attività didattica, la Pinacoteca, rinnovata ed adeguata agli standard europei, è oggi da annoverare tra le più moderne ed importanti Gallerie nazionali conosciute ed apprezzate all’estero.
Il suo patrimonio si è arricchito negli anni con nuove acquisizioni statali, lasciti e donazioni di privati che hanno completato il già vasto percorso artistico dell’arte emiliana che va dal XIII all’ inizio del XIX secolo."



"Ensaio sobre a Cegueira, Um Requiem pela Humanidade" de Jorge Salgueiro

(...) "Ensaio sobre a Cegueira" é a história de uma cegueira fulminante que ataca os habitantes de uma cidade. Poderia tratar-se de uma epidemia, de uma praga, isso não está explicado no livro nem importa, a única coisa que se diz é que a gente perde a visão. (...)
(...) Mas o autor crê que já estamos cegos com os olhos que temos, que não é necessário que nenhuma epidemia de cegueira venha a assolar a humanidade." (...)

em, "A Estátua e a Pedra
Fundação José Saramago
Páginas 34

(...) "O cão das lágrimas esgueirou-se pela escada 
acima, roçou como um sopro as saias da velha, que nem 
se apercebeu do perigo que acabara de passar por ela, e 
foi pôr-se ao lado da mulher do médico, donde anunciou 
aos ares a proeza cometida. A velha do primeiro andar, 
ouvindo ladrar com tamanha ferocidade, temeu, mas 
sabemos quão demasiado tarde, pela segurança da sua 
despensa, e gritou esticando o pescoço para cima, Esse 
cão tem de estar preso, não vá matar-me aí alguma 
galinha, Fique descansada, respondeu a mulher do 
médico, o cão não tem fome, já comeu, e nós vamo-nos 
embora agora mesmo, Agora, repetiu a velha, e houve na 
sua voz um quebramento como de pena, era como se 
estivesse a querer ser entendida de um modo muito 
diferente, por exemplo Vão-me deixar aqui sozinha, 
porém não pronunciou uma palavra mais, só aquele 
Agora que nem pedia resposta, os duros de coração 
também têm os seus desgostos, o desta mulher foi tal que 
depois não quis abrir a porta para despedir-se dos
desagradecidos a quem tinha dado passagem franca pela 
sua casa. Ouviu-os descer a escada, falavam uns com os 
outros, diziam, Cuidado, não tropeces, Põe a mão no meu 
ombro, Segura-te ao corrimão, são palavras de sempre, 
mas agora mais comuns neste mundo de cegos, o que lhe 
pareceu estranho foi ouvir uma das mulheres dizer, Aqui 
está tão escuro que não consigo ver, que a cegueira desta 
mulher não fosse branca já era, só por si, surpreendente, 
mas que ela não pudesse ver por estar escuro, que 
poderia isto significar. (...) 
Excerto do "Ensaio sobre a Cegueira"



Título: Ensaio sobre a Cegueira
Obra: Ensaio sobre a Cegueira
Compositor: Jorge Salgueiro
Intérprete Orquestra Sinfónica do Porto Casa da Música
Registo Áudio
Título Ensaio sobre a Cegueira
Tipo de Registo Áudio Música
Tipo de Suporte CD
Faixas 1-22
Número de Pistas 2
Duração 00:76:00
Intérpretes da Gravação Sara Belo (soprano), Sílvia Filipe (mezzo-soprano), Inês Homem de Melo Marques (voz de criança) Coros do Círculo Portuense de Ópera Orquestra Nacional do Porto Jorge Salgueiro (direcção)



José Saramago e as suas palavras repletas de musicalidade e melodia...

Descobri uma brilhantíssima inserção de um post no blogue "Nossa Rádio", datado de 22 de Junho de 2010, por Álvaro Ferreira, abordando uma compilação de poemas de José Saramago, musicados por alguns artistas. 
A lista é riquíssima e vasta, merece a exploração e audição destas referências.
Como base de trabalho exploratório, aqui reproduzo as palavras e conhecimentos de Álvaro Ferreira. 


Publicado no Blogue " A Nossa Rádio... Ouvintes com Opinião"

Link do blogue, em http://nossaradio.blogspot.pt/

Link do post, em http://nossaradio.blogspot.pt/2010/06/jose-saramago-na-musica-portuguesa.html

"Muito antes do compositor italiano Azio Corghi (*), se ter debruçado sobre a produção romanesca e teatral de José Saramago, já a obra poética do autor – que compreende os livros "Os Poemas Possíveis" (Portugália, 1966), "Provavelmente Alegria" (Livros Horizonte, 1970) e "O Ano de 1993" (Futura, 1975) – merecera a atenção de grandes compositores e intérpretes portugueses. Luís Cília, durante o exílio em França, foi o primeiro a musicar e a cantar a poesia de Saramago, na trilogia "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours" (1967, 1969 e 1971), portanto, cerca de três décadas antes da atribuição do Prémio Nobel da Literatura. Seguiu-se Manuel Freire, com os poemas "Fala do Velho do Restelo ao Astronauta" (1971), "Ouvindo Beethoven" (1973) e "Dia Não" (1978), que viriam a ser regravados com novos arranjos, em 1999, no álbum "As Canções Possíveis". Com os outros nove poemas que completam o alinhamento deste CD, Manuel Freire afirmou-se o mais dedicado intérprete da poesia de José Saramago, e quiçá o que melhor a cantou.
Embora de forma mais avulsa, também Pedro Barroso, Carlos do Carmo, Mísia, Amélia Muge, Fernando Tordo e Marco Oliveira juntaram os seus nomes à galeria dos que deram voz cantada aos versos do grande escritor.
Aqui fica o rol das versões conhecidas, perfazendo as três dezenas, considerando-se as regravações que alguns poemas tiveram. É muito provável que a lista esteja incompleta e, nessa conformidade, os leitores ficam convidados a indicar as eventuais ausências (contacto: ajferreira1974@gmail.com).
A ordem é cronológica e alfabética (no caso de temas pertencentes ao mesmo disco).

1. Contracanto – Luís Cília (in LP "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", vol. 1, Moshé-Naim, 1967)
2. Dia Não – Luís Cília (in LP "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", vol. 1, Moshé-Naim, 1967; CD "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", Moshé-Naim, 1996)
3. Há-de haver – Luís Cília (in LP "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", vol. 2, Moshé-Naim, 1969; CD "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", Moshé-Naim, 1996)
4. Não me peçam razões – Luís Cília (in LP "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", vol. 2, Moshé-Naim, 1969; CD "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", Moshé-Naim, 1996)
5. Poema à boca fechada – Luís Cília (in LP "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", vol. 3, Moshé-Naim, 1971)
6. Venham leis – Luís Cília (in LP "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", vol. 3, Moshé-Naim, 1971; CD "La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours", Moshé-Naim, 1996)
7. Fala do Velho do Restelo ao Astronauta – Manuel Freire (in EP "Dulcineia", Zip Zip, 1971; CD "Pedra Filosofal", Strauss, 1993, CNM, 2004)
8. Ouvindo Beethoven – Manuel Freire (in EP "Abaixo D. Quixote", Sassetti, 1973; CD "Pedra Filosofal", Strauss, 1993, CNM, 2004)
9. Dia Não – Manuel Freire (in LP "Devolta", Diapasão/Lamiré, 1978)
10. Nasce Afrodite Amor Nasce o Teu Corpo – Pedro Barroso (in LP "Água Mole em Pedra Dura", Sassetti, 1978; CD "Cartas a Portugal", Strauss, 2000)
11. Aprendamos o Rito – Carlos do Carmo (in LP "Mais do Que Amor é Amar", Philips/Polygram, 1986, reed. Philips/Polygram, 1996)
12. Fado Adivinha – Mísia (in CD "Fado", BMG Ariola, 1993)
13. Nenhuma Estrela Caiu – Mísia (in CD "Garras dos Sentidos", Erato, 1998)
14. Aprendamos o Rito – Carlos do Carmo (in CD "Ao Vivo no CCB: Os Sucessos de 35 Anos de Carreira", EMI-VC, 1999)
15. A Ponte – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
16. Circo – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
17. Dia Não – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
18. Dispostos em Cruz – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
19. É Tão Fundo o Silêncio – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
20. Fala do Velho do Restelo ao Astronauta – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
21. Jogo do Lenço – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
22. Nem Sempre a Mesma Rima – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
23. Ouvindo Beethoven – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
24. Retrato do Poeta Quando Jovem – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
25. Tenho a Alma Queimada – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
26. Tenho um Irmão Siamês – Manuel Freire (in CD "As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago", Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)
27. Se Não Tenho Outra Voz – Amélia Muge (in CD "A Monte", Vachier & Associados, 2002)
28. Fado Adivinha II – Mísia (in CD "Drama Box", Liberdades Poéticas/EMI-VC, 2005)
29. Circo – Fernando Tordo (in CD "Tributo a los Laureados Nobel", Factoría Autor, 2005)
30. Retrato do Poeta Quando Jovem – Marco Oliveira (in CD "Retrato", HM Música, 2008)

A estas versões cantadas, acrescentam-se as gravações de poesia dita/recitada. Além dos espécimes presentes em edições discográficas, como é o caso do poema "Circo", recitado por Vítor de Sousa no CD "No Palco da Poesia" (Ovação, 1995, reed. 2000), há que considerar os registos existentes no arquivo sonoro da RDP, na voz de António Cardoso Pinto, Paulo Rato e outros.
Sem prejuízo da transmissão de excertos de entrevistas de José Saramago, era expectável e desejável que a direcção de programas da Antena 1, nos dias em que Portugal se despediu do seu (primeiro e único, até agora) Nobel da Literatura, deitasse mão aos seus poemas – os cantados e os recitados – e os desse a ouvir, se não na íntegra, numa boa parte. Mas não. Será que Rui Pêgo e os seus adjuntos não tinham conhecimento da existência de tão importante acervo fonográfico? Se não tinham, podiam ter-se dignado perguntar a quem os soubesse informar. Enfim... mais um triste episódio que põe a nu as gritantes deficiências que se vêm verificando no serviço público de radiodifusão.

(*) Azio Corghi compôs as seguintes obras, baseadas em livros/textos de José Saramago: "Blimunda" (1989 - ópera, a partir do romance "Memorial do Convento"); "Divara" (1993 - ópera, a partir da peça "In Nomine Dei"); "La Morte di Lazzaro" (1995 - cantata dramática); "Cruci-Verba" (2001 - para voz recitante e orquestra, a partir do romance "O Evangelho Segundo Jesus Cristo"); "De Paz e de Guerra" (2002 - cantata para coro e orquestra); "Il Dissoluto Assolto" (2005 - ópera, a partir da peça "Don Giovanni ou o Dissoluto Absolvido").
Em Portugal, Jorge Salgueiro é autor de "Ensaio sobre a Cegueira: um Requiem pela Humanidade" (2004 - ed. Tradisom, 2005), composto para a adaptação dramática do romance "Ensaio sobre a Cegueira", levada à cena pela companhia de teatro "O Bando", em co-produção com o Teatro Nacional de São João (Porto)."

Carlos do Carmo que canta poemas de José Saramago, recebe Grammy Latino de Carreira

Notícia do Jornal I, em 5 de Julho de 2014
Sob o título "Três ex-presidentes deram os parabéns a Carlos do Carmo. Só Cavaco não o fez", mais uma vez, Cavaco Silva, demonstra a incapacidade de homenagear cabalmente e com a solenidade que as distinções merecem e obrigam, os que seguem desalinhados no elogio à suposta figura máxima do "Estado" português.




"Não sinto falta", diz o fadista sobre o silêncio de Belém em relação à distinção que recebeu esta semana
O fadista Carlos do Carmo, galardoado com um Grammy pela sua carreira, diz ao i não ter recebido qualquer mensagem - ainda que privada - de felicitações da parte de Cavaco Silva. Ao contrário do que aconteceu com os três ex-presidentes da República: "Recebi felicitações do general Ramalho Eanes, de Mário Soares e de Jorge Sampaio."
As regras de Belém têm ditado que, quando um português é distinguido com um prémio de relevo, a Presidência emite uma nota de congratulação. Desta vez não aconteceu. Mesmo sabendo que, em 2008 - quando Carlos do Carmo recebeu o Prémio Goya para a melhor canção original -, a Presidência divulgou uma nota de felicitações pela "distinção".
Apesar da insistência do i, a Presidência voltou a não tecer qualquer comentário à atribuição do Grammy ao fadista. Também por isso, Carlos do Carmo diz, sobre a ausência de um cumprimento de Belém: "Tenho de confessar que não sinto falta. O problema não é meu", remata.
Entre o Goya e o Grammy distam seis anos e muitas críticas do fadista a Cavaco Silva. Por exemplo, em 2011, quando Carlos do Carmo o apontou como o responsável número 1 pela situação em que o país se encontrava - passavam então seis meses sobre a assinatura do Memorando.
À Renascença, o fadista disse que "toda a nossa desgraça começou com Cavaco". No ano passado, à SIC Notícias, Cavaco voltava a estar sob o foco de Carlos do Carmo. "Ter este Presidente da República como primeiro- -ministro e como Presidente foi um azar dos Távoras. Este país regrediu muito. É só analisar. Foi mau de mais para ser verdade." Mas os comentários mais negativos estavam ainda para ser feitos. E chegaram em Novembro do ano passado, na Aula Magna. O encontro promovido por Mário Soares ficou marcado por fortes críticas ao chefe de Estado, também de Carlos do Carmo. "Nunca me passou pela cabeça, depois de 40 anos de salazarismo, levar com este homem 20 anos. Um homem que é inseguro, inculto, medroso. E não interpretem isto como uma questão pessoal, não sou dado a questões pessoais", referiu o fadista.



Notícia, via Observador, aqui em 

"O fadista Carlos do Carmo recebe hoje o Grammy Latino de Carreira, no Hollywood MGM Theatre, em Las Vegas, no Nevada, antecedendo a entrega anual dos Grammy Latinos, na quinta-feira.
Além do criador de “Canoas do Tejo”, recebem igualmente um Grammy de Carreira, por “Excelência Musical”, Willy Chirino, César Costa, o Dúo Dinámico, Los Lobos, Valeria Lynch e Ney Matogrosso.
Nesta mesma cerimónia, prevista para as 10:00 locais (18:00, hora continental portuguesa), recebem o Prémio do Conselho Diretivo da Latin Academy of Recording Arts and Sciences (LARAS) os músicos André Midani e Juan Vicente Torrealba.
“O ‘Board of Trustees’ da Latin Academy of Recording Arts and Sciences decidiu, por unanimidade, atribuir a Carlos do Carmo o “‘Lifetime Achievement Award’, galardão que distingue a obra das grandes referências do panorama musical internacional”, segundo comunicado da academia.
Em declarações à Lusa o fadista afirmou: “Num momento de sofrimento como o que o meu povo está a viver, e a minha pátria está a viver, a alegria que possa dar às pessoas, apesar da simplicidade que as coisas têm – isto não lhes mata a fome, nem lhes arranja emprego -, mas que possa dar-lhes uma alegria, já fico muito contente”.
O artista, com uma carreira de 51 anos, disse que esta é uma oportunidade para dar a conhecer outros artistas portugueses que, no futuro, podem vir a ser premiados.
Fazendo uma reflexão da sua carreira, Carlos do Carmo, filho da fadista Lucília do Carmo, afirmou: “Corri sempre em pista própria e não em pista de competição, nunca competi, até porque cantar não é o mesmo que correr. Há sempre gostos. Uns gostam mais de A, outros, de B. Isso não quer dizer que A ou B cantem muito bem ou cantem mal, são os gostos das pessoas”.
A cerimónia anual de entrega dos Grammy Latinos, nas diferentes categorias, realiza-se, na quinta-feira, a partir das 20:00 locais (05:00, de sexta-feira, na hora continental portuguesa)."


Carlos do Carmo - "Aprendamos o Rito"
Poema: José Saramago
Música: Muiguel Ramos


"APRENDAMOS O RITO"

Põe na mesa a toalha adamascada
Traz as rosas mais frescas do jardim
Deita o vinho no copo, corta o pão
Com a faca de prata e de marfim

Alguém veio juntar-se à tua mesa
Alguém a quem não vês mas que pressentes
Cruza as mãos no regaço, não perguntes
Nas perguntas que fazes é que mentes

Prova depois o vinho, come o pão
Rasga a palma da mão no caule agudo
Leva as rosas à fronte, cobre os olhos
Cumpriste o ritual e sabes tudo. .

Relembrando a activista e resistente Saharaui Aminatou Haidar

Declaração Pública de José Saramago

"O que fez Aminatou Haidar, ao colocar em risco a sua própria vida tem de servir para despertar a comunidade internacional para um problema que já deveria ter sido resolvido há muitos anos", disse José Saramago depois de se encontrar com Aminatou Haidar, no Aeroporto de Lanzarote, onde se encontra extremamente fragilizada.
O Prémio Nobel da Literatura José Saramago pediu, à ONU "que imponha a Marrocos o cumprimento das suas resoluções sobre o Sahara Ocidental".


José Saramago, no Aeroporto de Lanzarote, afirmando pessoalmente a sua solidariedade para com a resistente saharaui, Aminatou Haidar. Na altura estava em greve de fome, depois de lhe ter sido recusada a entrada em Aaiún, capital do Sahara Ocidental ocupado.



Carta aberta, redigida por José Saramago à activista

"Se estivesse em Lanzarote, estaria contigo.

Não porque seja um militante separatista, como te definiu o embaixador de Marrocos, mas precisamente pelo contrário. Acredito que o planeta a todos pertence e todos temos o direito ao nosso espaço para poder viver em harmonia. Creio que os separatistas são todos aqueles que separam as pessoas da sua terra, as expulsam, que procuram desenraizá-las para que, tornando-se algo distinto do que são, eles possam alcançar mais poder e os que combatem percam a sua auto-estima e acabem por ser tragados pela irracionalidade.

Marrocos em relação ao Sahara transgride tudo aquilo que são as normas de boa conduta. Desprezar os Saharauis é a demonstração de que a Carta dos Direitos Humanos não esta enraizada na sociedade marroquina, que não se rebela com o que se faz ao seu vizinho, e que é a prova de que Marrocos não se respeita a si próprio – quem está seguro do seu passado não necessita expropriar quem lhe está próximo para expressar uma grandeza que ninguém jamais reconhecerá. Porque se o poder de Marrocos alguma vez acabasse por vergar os saharauis, esse pais admirável por muitas e muitas coisas, teria obtido a mais triste vitoria, uma vitoria sem honra, nem glória, erguida sobre a vida e os sonhos de tanta gente, que apenas quer viver em paz na sua terra, em convivência com os seus vizinhos para que, em conjunto, possam fazer desse continente uma lugar mais feliz e habitável.

Querida Aminetu Haidar,

Dás um exemplo valioso em que todas as pessoas e todo o mundo se reconhecem. Não ponhas em risco a tua vida porque tens pela frente muitas batalhas e para elas és necessária. Os teus amigos, e os amigos do teu povo, defender-te-mos em todos os foros que forem necessários.

Ao Governo de Espanha pedimos sensibilidade. Para contigo, e para com o teu povo. Sabemos que as relações internacionais são muito complexas, mas há muito anos que foi abolida a escravidão tanto para as pessoas como para os povos. Não se trata de humanitarismo, as resoluções das Nações Unidas, o Direito Internacional e o senso comum estão do lado certo, e em Marrocos e em Espanha disso se sabe.

Deixemos que Aminetu regresse a sua casa com o reconhecimento do seu valor, à luz do dia, porque são pessoas como ela que dão personalidade ao nosso tempo e sem Aminetu todos, seguramente, seriamos mais pobres.

Aminetu não tem um problema. Um problema tem seguramente Marrocos. E pode resolvê-lo… terá que resolvê-lo. Não se trata apenas de um problema de uma mulher corajosa e frágil, mas sim o de todo um povo que não se rende já que não entende nem a irracionalidade nem a voracidade expansionista, que caracterizavam outros tempos e outros graus de civilização.

Um abraço muito forte, querida Aminetu Haidar

José Saramago"

Aminatou Haidar (Izquierda) abraza a la periodista y viuda de José Saramago, Pilar del Río, que recogió en Sevilla el Premio a la Solidaridad Juan Antonio González Caraballo, otorgado al escritor portugués.