Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

sábado, 18 de janeiro de 2020

12 a 17 de Janeiro de 1997 - "Cadernos de Lanzarote V"

12 de Janeiro
(...) "Primeira participação no programa da RDP O Mundo de..., para que Adelino Gomes me convidou em Novembro do ano passado. Voltarei de cinco em cinco semanas,decidido, como sempre, a não dizer o que não penso..."

13 de Janeiro
"Pastelaria Versalhes. Enquanto almoço, entretenho-me a pensar nos enredos do livro que ando a ensinar a andar, este Todos os Nomes por enquanto bastante inseguro de pernas, quando uma palavra repetidamente dita numa mesa próxima começou a romper a muralha de abstracção em que me tinha envolvido e a empurrar o estaleiro do romance para fora da área dos cuidados imediatos. A palavra era «universo»" (...)

17 de Janeiro
"Hoje, em Lanzarote, lendo o jornal, enquanto tomava o sol no terraço, tive noticias do Universo, aquele cujo nome costumamos escrever com a letra inicial maiúscula para não fazer confusão com o da Pastelaria Versalhes. Dois cientistas da Universidade do Michigan, Fred Adams e Greg Laughlin, afirmam que acabará dentro de um numero de anos definido por 154 zeros (...) Pressinto que não viverei tanto..." (...)

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12 a 17 de Janeiro de 1996 - "Cadernos de Lanzarote IV"

13 de Janeiro
"Em Lisboa, para votar. Encontro alguns amigos preocupados com o resultado das eleições de amanhã. Tudo aponta para um vitória folgada de Jorge Sampaio, mas eles duvidam, parece-lhes bom de mais para poder ser verdade. Apresento um argumento para o qual não há resposta: «É impossível que este país tenha como presidenta da República um homem chamado Aníbal Cavaco Silva. Não porque não fizesse sentido, mas porque o faria de mais...»" (...)

14 de Janeiro
"A minha tranquilidade tinha razão, Jorge Sampaio ganhou. À noite, de Lanzarote, telefona-me Pilar a dizer que El País se lembrou de pedir um artigo sobre as eleições." (...)

15 de Janeiro
"«A esquerda explicada». Assim chamei o artigo, interrompido não sei quantas vezes por chamadas de urgência. Não sei se os leitores vão realmente encontrar a esquerda explicada. Por mim, penso que esta será uma maneira tão boa como outra de dizer o que a esquerda é" (...)

16 de Janeiro
"Juan Goytisolo veio a Lanzarote para dar uma conferência. Com ele veio Monique Lange, sua amiga e companheira, mulher inteligente, de uma simplicidade rara, que em tempos foi secretária de Gaston Gallimard." (...)

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12 a 17 de Janeiro de 1995 - "Cadernos de Lanzarote III"

12 de Janeiro
"E vão três. Suspeito que os cães de Lanzarote andam a passar a palavra uns aos outros. Agora é uma cadela de uma raça a que aqui chamam sato, cor de amarelo-torrado (...) Desde há três dias que não nos larga a porta. Demos-lhe comida e água, em que começou por não tocar. Tremia, assustada. Depois foi-se tranquilizando, comeu e matou a sede. Pepe e Greta não foram simpáticos ao princípio, mas não tardaram muito a aceitá-la." (...)

13 de Janeiro
"A experiência pessoal e as leituras só valem o que a memória tiver retido delas.Quem tenha lido com alguma atenção os meus livros sabe que, o que ali há é um contínuo trabalho sobre os materiais da memória, ou, para dizê-lo com mais precisão, sobre a memória que vou tendo daquilo que, no passado, já foi memória sucessivamente acrescentada e reorganizada, à procura de uma coerência própria em cada momento seu e meu." (...)

15 de Janeiro
"Contra mim falo: o melhor que às vezes os livros têm são as epígrafes que lhes servem de credencial e carta de rumos." (...)

16 de Janeiro
"O Livro dos Conselhos não existe."

17 de Janeiro
"Sempre se morre demasiado cedo. Miguel Torga sai do mundo aos 87 anos, depois de uma longa e dolorosa doença. (...) 
Não conheci Miguel Torga. Nunca o procurei, nunca lhe escrevi.. Limitei-me a lê-lo, a admirá-lo muitas vezes, outras não tanto." (...) 

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12 a 17 de Janeiro de 1994 - "Cadernos de Lanzarote II"

12 de Janeiro
"Conversa com João Mário Grilo e Clara Ferreira Alves sobre o documentário - formato «Artes e Letras» - que Isabel Colaço teve a ideia de produzir." (...)
"Há dias de sorte. Tive hoje - 12 de Janeiro - a grata satisfação de receber do Gabinete das Relações Culturais Internacionais da Secretaria de Estado da Cultura um fax que se fazia acompanhar de uma carta da Fundación El Libro, de Buenos Aires, datada de 13 de Setembro do ano passado, em que me convidam a participar na Feira do Livro que em Março ali se irá realizar." (...) 

13 de Janeiro
"Diz o Gabinete das Relações Culturais Internacionais da Secretaria de Estado da Cultura que não teve culpa. Diz que o convite lhe foi comunicado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros em 2 de Novembro e que o imediatamente o transmitiu ao Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro" (...)

17 de Janeiro
"Durante quatro dias a casa esteve transformada num pequeno estúdio de cinema (...) eu respondendo às perguntas de Clara, eu escutando as recomendações de João Mário, eu esforçando-me por parecer inteligente na palavra, no gesto, na expressão.

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domingo, 12 de janeiro de 2020

11 de Janeiro de 1997 - "Cadernos de Lanzarote V"

"Lisboa. Leio que Le Figaro dedicou alguns comentário elogiosos à pianista «argentina» Maria João Pires... É um lugar-comum das anedotas internacionais dizer-se que os franceses não sabem geografia. O pio é que, pelos vistos, não estão dispostos a aprendê-la (...) É sempre desculpável um erro involuntário, mas nunca a leviandade, a indiferença, a imponderação. (...)

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11 de Janeiro de 1996 - "Cadernos de Lanzarote IV"

"Há em Oviedo um cão boxer, chamado Simba, que, de vez em quando (soube-o agora por um recorte que de lá me chegou), escreve umas crónicas para os jornais, onde depois saem publicadas com o nome do dono. O dono do Simba é o escritor asturiano Manuel Herrero, que teve a inaudita ventura de lhe haver saído na rifa um cão com habilidades de literato. A mim, que tenho não um, mas três cães, não acontecem fortunas dessas. O que os meus fazem, além do comer, ladrar e dormir que a natureza pede, é entrar-me a toda a hora no escritório para fiscalizar o andamento do trabalho. Greta, que é a mais abelhuda, tem a mania de subir-me para o colo, suponho que para ver de perto o que estou a fazer. Pepe, digno e discreto, como mais velho, limita-se a sentar-se, a levantar a cabeça e a pôr-me uma pata na perna, pregando em mim um olhar que significa claramente: «Como vai isso?» Quanto a Camões, que, esse sim, poderia indicar-me o caminho para a imortalidade, desconfio que resolveu abandonar definitivamente as letras depois de ter escrito Os Lusíadas. Se alguma vez o Manuel Herrero vier de visita a Lanzarote, pedir-lhe-ei que traga consigo o Simba para que leia aos cachorros da casa o belíssimo artigo que sobre eles e sobre mim escreveu, justa e precisamente intitulado «Os amigos de Saramago»…

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11 de Janeiro de 1995 - "Cadernos de Lanzarote III"

"Carlos Câmara Leme, do Público, pediu-me, a propósito da próxima publicação duma edição crítica dos poemas de Ricardo Reis, umas palavras que recordassem as circunstâncias em que os li pela primeira vez." (...)

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Carlos Câmara Leme

Aqui pode ser recuperado um post com entrevista de José Saramago ao jornalista do Público
http://desaramago.blogspot.com/2017/01/o-presente-e-uma-linha-tenue.html
"O presente é uma linha ténue" Recuperação da entrevista de Carlos Câmara Leme a José Saramago (Público, 25/10/1997)

A entrevista pode ser recuperada e consultada aqui
em http://static.publico.pt/docs/cmf/autores/joseSaramago/todosOsNomes.htm

"Público" de 25 de Outubro de 1997
"O presente é uma linha ténue"
Por Carlos Câmara Leme

11 de Janeiro de 1994 - "Cadernos de Lanzarote II"

"José Manuel Mendes partiu hoje, levando umas cinco ou seis horas de gravações. Não lhe invejo a sorte, ter de desenredar de um discurso sempre digressivo e não raro caótico umas quantas ideias mais ou menos aproveitáveis que por lá se encontrem. (...) Chegou carta de Jorge Amado. O Instituto de Letras da Universidade da Bahia organiza em Maio em encontro de tradutores e um seminário de ensino e aprendizagem de tradução (...) Pilar e eu lemos a carta ao mesmo tempo, e quando chegámos ao fim ele perguntou-me: «Que viagens temos em Maio?» Ainda que não pareça decididamente explícito, foi uma maneira de dizer sim..."

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Jorge Amado e José Saramago 
1990 Bahia - Brasil

sábado, 11 de janeiro de 2020

10 de Janeiro de 1997 - "Cadernos de Lanzarote V"

"Barcelona, Palácio Güell. Gravação da entrevista para o programa Negro sobre blanco, de Fernando Sanchéz Dragó. O tema foi o Ensaio sobre a Cegueira. Ajudaram generosamente à conversa Raúl Morodo, actual embaixador de Espanha em Lisboa, e Miguel Durán. A propósito, Miguel contou que, no tempo do franquismo, um notável do regime, cujo nome, se chegou a dizê-lo, me escapou, sugeriu ao governo a construção de uma cidade destinada exclusivamente para cegos." (...)

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10 de Janeiro de 1996 - "Cadernos de Lanzarote IV"

"A RTP (abençoada ela seja por esta vez) trouxe-nos, decentemente concebido e realizado, um documentário sobre Fernando Lopes-Graça. Éramos quatro (Carmélia e a mãe, Pilar e eu) os que, recolhidamente, escutávamos as palavras do amigo desaparecido e assistíamos a uma reconstituição ordenada da sua vida. Enquanto o documentário ia passando, imagens, palavras, palavras e imagens, a informação pareceu-me bastante equilibrada, satisfatória, quem em amplitude quer em rigor, mas, quando ele chegou ao fim, tive a impressão, como já me tem sucedido em casos semelhantes, de que o mais importante tinha ficado por mostrar." (...)

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Cartaz alusivo ao evento que marcou os 90 anos da data de nascimento de José Saramago, com apresentação de obras de Fernando Lopes-Graça (12/12/2012)

10 de Janeiro de 1994 - "Cadernos de Lanzarote II"

"De Jerusalém telefona-me a minha tradutora, Miriam Tivon, para me dar notícias do Evangelho (excelentes), mas sobretudo para informar-me de que um fotógrafo de Israel (dos melhores, segundo Miriam) quer convidar-me a escrever algo sobre fotografias suas, e de tudo, imagens e palavras, fazer depois um livro. Se lembrar que já tenho um compromisso com Arno Hammacher, o amigo holandês que aqui passará todo o mês de Fevereiro a fazer fotografias para um livro seu e meu sobre Lanzarote, começarei a desconfiar que os fotógrafos deste mundo andam, sinistramente, a passar palavra uns aos outros..."

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Bruna Lombardi entrevista José Saramago para o programa "Gente de Expressão"

Recuperação da entrevista de Bruna Lombardi a José Saramago


quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

9 de Janeiro de 1996 - "Cadernos de Lanzarote IV"

"Os dados estão lançados. Expedida por Ray-Güde Mertin, uma longa tira de papel saída do fax, que reproduz treze páginas do contrato, diz-me que cedi os direitos de adaptação cinematográfica da Jangada de Pedra." (...)

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9 de Janeiro de 1995 - "Cadernos de Lanzarote III"

"Duzentas e vinte milhas a nordeste de Lanzarote, o mar grosso meteu no fundo um barco de pesca português. Leio que, entre tripulantes marroquinos e portugueses, morreram vinte pescadores. O barco era de Sesimbra e chamava-se Menino de Deus. Têm-me dito que Deus e Alá estão em toda a parte, como é próprio de deuses. Não duvido que estejam, mas não salvaram os seus meninos..."

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9 de Janeiro de 1994 - "Cadernos de Lanzarote II"

"Assim são as coisas. Gabei-me aqui de não ter gasto muito tempo a dissuadir Zeferino Coelho da sua vontade de levar os Cadernos para publicar já, e afinal o José Manuel Mendes levou ainda menos a convencer-me do contrário. (...) Compreendi que a relutância provinha só de um temor não confessado a enfrentar-me com reacções suscitadas por referências feiras nestas páginas a pessoas e procedimentos." (...) 

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"Invitation au voyage L’Alentejo de José Saramago" de Linda Lorin para o canal Arte (em Françês)

"Invitation au voyage
L’Alentejo de José Saramago / Malaisie / Le pont de Brooklyn"

A reportagem pode ser consultada aqui
em https://www.arte.tv/fr/videos/091152-007-A/invitation-au-voyage/?fbclid=IwAR3wdwIJNxuZtzrPDOha4Oq16PZGh-NtNHsjDcZ5r7dOUNncElcITcml32o

"Linda Lorin nous emmène à la découverte de notre patrimoine artistique, culturel et naturel. Dans ce numéro : L’Alentejo vibrant de José Saramago - So british, la Malaisie des Cameron Highlands - Sur le pont de Brooklyn, ça trompe énormément.

L’Alentejo vibrant de José Saramago
En 1976, José Saramago, alors journaliste au chômage, séjourne dans la région de l’Alentejo au Portugal. Le futur prix Nobel de littérature puise dans ces terres sèches et dans le destin tourmenté des travailleurs agricoles l’inspiration pour écrire "Relevé ""de terre", l’un de ses romans majeurs."


"O Conto da Ilha Desconhecida" no Teatro Municipal Baltazar Dias (Funchal - Madeira)

A notícia pode ser recuperada e consultada aqui
em https://www.dnoticias.pt/impressa/hemeroteca/diario-de-noticias/conto-de-saramago-musicado-estreia-a-22-de-maio-no-tmbd-CA5640756


"‘O Conto da Ilha Desconhecida’ é um conto musical composto por Sérgio Azevedo a partir da obra homónima de José Saramago, uma encomenda do Teatro Municipal Baltazar Dias (TMBD) a estrear no dia 22 de Maio pela Orquestra Académica do Conservatório - Escola Profissional das Artes da Madeira."
"Francisco Loreto mostrou a partitura que já tem em mãos, nas redes sociais."
Fotografia dnoticias.pt

"Sérgio Azevedo (na foto) é o autor da música do conto criado por José Saramago." 
Fotografia de David Rodrigues dnoticias.pt

8 de Janeiro de 1997 - "Cadernos de Lanzarote V"

"Leio (...) que o retrato do primeiro-ministro António Guterres vai ser colocado nas paredes das repartições públicas do país. Pensava eu que nos havíamos curado destas demonstrações iconográficas depois de tantos anos a aturar deus-pátria-família e seus derivados, com o sábio varão de Santa Comba a fiscalizar do alto os impostos que pagávamos à boca do cofre ou com juros de mora, sob a presidência, conforma as épocas e mandatos, do bigode mosqueteiro de Carmona, do ar de quero-mas-não-posso de Craveiro Lopes, da expressão transcendentalmente estúpida de Américo Tomás..." (...) 

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8 de Janeiro de 1996 - "Cadernos de Lanzarote IV"

"Na noite de Natal puseram-me no sapatinho a promessa de uma antena parabólica. Pilar tinha achado que eu não podia continuar a viver sem notícias regulares da pátria, especialmente nestes dias que vamos ter eleições para a Presidência da República. (...) Sabia, pelas informações da meteorologia espanhola, que andava a chover muito em Portugal, mas não imaginava que o desastre atingisse tal dimensão. Percebi então que estar longe é não poder participar, não ser molhado pelas mesmas chuvas, não sentir as mesmas aflições." (...)

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8 de Janeiro de 1995 - "Cadernos de Lanzarote III"

"Há tempos prometi a Lakis Proguidis, para o seu L'atelier du roman, um ensaio sobre Ernesto Sábato, para o qual até já dispunha de título, uma vez que, como é minha incorrigível tineta, baptizo sempre a criança antes de ela ter nascido. Chamar-se-ia O Olhar Sobrevivente. O condicional já está aí a dizer que a promessa não chegou a ser cumprida. Talvez regresse um dia a esse projecto, mas nunca antes de me libertar da legião de cegos que me rodeia. Aliás, é bem possível que o título me tenha vindo, por desconhecidos caminhos, daquele «olhar sobrevivente» que, em sentido literal, existe no Ensaio sobre a Cegueira. Isso e, por diferentes vias, o Informe sobre Cegos do mesmo Sábato (onde o número de cegos não conta comparado com os do Ensaio...), é o que provavelmente me terá levado ao título desse outro «ensaio» que ficou por escrever." (...) 

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José Saramago com Ernesto Sábato

8 de Janeiro de 1994 - "Cadernos de Lanzarote II"

"Chegaram-nos ecos do desastre que terá sido a participação de Zita Seabra no programa de Manuela Moura Guedes. Entristece-me verificar como afinal valia tão pouco, intelectual e eticamente falando, alguém a quem os acasos e as necessidades políticas colocaram em funções e confiaram missões de responsabilidade dentro e fora do partido." (...)

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terça-feira, 7 de janeiro de 2020

7 de Janeiro de 1996 - "Cadernos de Lanzarote IV"

"No dia em que principiei estes Cadernos, tinha começado também a escrever o que viria a ser O conto burocrático do capitão do porto e o director da alfândega, aproveitando um caso real de acumulação de funções que tive conhecimento por Ângela Almeida (...) 

O conto foi recuperado e publicado neste blog aqui

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7 de Janeiro de 1995 - "Cadernos de Lanzarote III"

(...) "Fui ver no mapa onde fica Urqueira (...) a uns dez quilómetros de Vila Nova de Ourém. Tem uma Caixa de Crédito de Agrícola que, segundo se descobriu e a polícia investiga, fazia parte de uma rede de falsificação de meios de pagamento a traficantes de órgãos humanos. 
Graças a Deus, imagino, os directores da Caixa nunca tocaram com as suas honestas mãos os fetos congelados: só faziam a contabilidade, passavam cheques e guardavam comissões. Para a educação dos filhos, claro."

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7 de Janeiro de 1994 - "Cadernos de Lanzarote II"

Sobre o mito da batalha de Ourique
"Reminiscências histórico-melancólicas. Durante séculos, como se tivessem sido testemunhas presenciais do milagre, os portugueses acreditaram piamente que Cristo apareceu a D. Afonso Henriques antes da batalha de Ourique, garantido-lhes não só ajuda imediata como protecção para o futuro, tanto para ele como para os seus descendentes." (...)

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"O Milagre de Ourique" é uma pintura a óleo sobre tela do pintor português Domingos Sequeira realizada em 1793 e que está em exposição no Museu Louis-Philippe do Palácio de Eu em França.


"José e Pilar" - Trailer Oficial produzido pela Jumpcut Portugal

Pode ser recuperado via YouTube aqui


Sinopse

A Viagem do Elefante, o livro em que Saramago narra as aventuras e desventuras de um paquiderme transportado desde a corte de D. João III à do austríaco Arquiduque Maximiliano, é o ponto de partida para José e Pilar, filme de Miguel Gonçalves Mendes que retrata a relação entre José Saramago e Pilar del Río.

Mostra do dia-a-dia do casal em Lanzarote e Lisboa, na sua casa e em viagens de trabalho por todo o mundo, José e Pilar é um retrato surpreendente de um autor durante o seu processo de criação e da relação de um casal empenhado em mudar o mundo -- ou, pelo menos, em torná-lo melhor.

José e Pilar revela um Saramago desconhecido, desfaz ideias feitas e prova que génio e simplicidade são compatíveis. José e Pilar é um olhar sobre a vida de um dos grandes criadores do século XX e a demonstração de que, como diz Saramago, "tudo pode ser contado de outra maneira".

"Evangelho segundo Jesus Cristo"

(...) "José dormia, com um sorriso resignado nos lábios, mas triste era como se sentiria se ouvisse Maria dizer-lhe, Que o não queira o Senhor, que de ciência certa sei eu que esse homem não tem onde descansar a cabeça. Em verdade, em verdade vos digo que muitas coisas neste mundo poderiam saber-se antes de acontecerem outras que delas são fruto, se, um com o outro, fosse costume falarem marido e mulher como marido e mulher." (...)

"Evangelho segundo Jesus Cristo"
Caminho (Pags 71 e 72)



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segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

6 de Janeiro de 1997 - "Cadernos de Lanzarote V"

"Tenho trabalhado com disciplina e louvável pontualidade em Todos os Nomes. Hoje decidi fazer uma pausa na obrigação de passar a estes Cadernos, como diários de bordo que também têm sido, alguns apontamentos, uns anteriores a 24 de Outubro do ano passado, que foi quando comecei a escrever o livro, outros do próprio dia em que lancei ao papel o princípio do romance.
Eis as primeiras  notas:
1. «Dando tempo às coisas, as coisas, em geral, resolvem-se. Em Amherst vi a história de que precisava para Todos os Nomes. (...)
 «Na repartição, ao ler, uma vez mais, o registo da pessoa, encontra um averbamento feito quinze dias antes por um colega: o registo do falecimento da mulher." (...) 
2.«Outra vez a questão dos nomes. À primeira vista, por contraste com o Ensaio, onde nenhuma personagem tem nome, aqui, com este título, parece que deveriam aparecer todos os nomes, que deveria haver mesmo a preocupação de fazê-los sobressair, de jogar com eles. Simplesmente, isso repugna-me. O nome das pessoas é demasiado intrigante para ser banalizado.» (...)
Eis outros apontamento: (...)

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Capa da recente edição da Porto Editora


6 de Janeiro de 1995 - "Cadernos de Lanzarote III"

"A sugestão que fiz em Lisboa, de que o Prémio Stendhal, para melhor justificar o nome que tem, passasse a interessar-se também pelas questões culturais (...) Do que se vai tratar, informa-me agora Dorio Mutti, presidente da Fundação Adelphi, organizadora do Prémio Stendhal, é de analisar os projectos culturais (...) já em curso na Europa, após o que serão propostos ao júri três ou quatro finalistas. É alguma coisa, mas não alcança os objectivos da sugestão que apresentei: trazer ao conhecimento e ao debato públicos os problemas culturais resultantes da integração europeia."

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6 de Janeiro de 1994 - "Cadernos de Lanzarote II"

"Pela segunda vez o impossível aconteceu. (...) Se chega a acontecer terceira, não sei o que sucederá à velha ordem do mundo. Foi o caso que na revista Cambio 16 desta semana apareceu um artigo assinado por Mário Ventura, desses que é costume escreverem-se por esta época sobre os desejos e votos para o ano que entra. Ou já entrou. Em dado passo pergunta-se o articulista se será este ano de 1994 que a literatura portuguesa se verá contemplada com o Nobel, o que, evidentemente, não é novidade (refiro-me à pergunta), porque todos os anos alguém aparece a fazê-la, sem resultado que se veja. O insólito da história consiste em apresentar-se o artigo ilustrado com uma fotografia minha, ainda por cima adornada com uma legenda que me associa ao suspiradíssimo prémio. (...) José Manuel Mendes, que aqui veio para fazer-me uma entrevista, diz que o sucedido prova a existência de Deus. Para o articulista, provará com certeza a existência do Diabo..." 

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Fotografia de José Manuel Mendes tirada por ocasião 
do 4.º aniversário da Fundação José Saramago 

domingo, 5 de janeiro de 2020

5 de Janeiro de 1995 - "Cadernos de Lanzarote III"

(...) "Quanto ao domínio norte-americano, creio ser ele uma invencível fatalidade: conhecemos-lhe as causas, não lhe ignoramos as intenções, e nada disso foi suficiente para que soubéssemos resistir aos metódicos processos de compressão e laminação cultural de que estamos a ser objecto, com as nossas culturas históricas a perderem rapidamente espessura vital e a coesão. Numa Europa incapaz de questionar-se a si própria, a postura hoje mais comum é a de uma resignação que tocou o fundo.
Escusado será dizer que nenhum estado de espírito poderia convir melhor a um projecto imperial alemão que deixou de dar-se ao trabalho de se disfarçar: ainda o jogo ia no princípio, e já o tínhamos perdido..."

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5 de Janeiro de 1994 - "Cadernos de Lanzarote II"

"De Niterói escreve-me Katia da Matta Pinheiro, que está preparando a sua dissertação de mestrado em História na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Diz-me que escolheu para objecto de pesquisa o Memorial do Convento, desenvolvendo a hipótese, palavras suas, de que o romance encerra possibilidades como obra historiográfica. (...) Katia faz-me perguntas a que irei responder o melhor que possa.
Os professores têm razão, o autor do Memorial não escreveu um livro de história e não tem nada a certeza de que a sociedade portuguesa do tempo fosse, realmente, como a retratou, embora, até ao dia em que estamos, sempre foi ponto de honra nosso sermos menos que os adversários." (...)

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sábado, 4 de janeiro de 2020

4 de Janeiro de 1997 - "Cadernos de Lanzarote V"

"Divara representa-se hoje em Catânia. Confusões inesperadas sobre escalas e ligações de voos entre as duas ilhas - Lanzarote e Sicília -, (...) impediram-me de fazer a viagem e apreciar a novidade absoluta de escutar a ópera de Corghi cantada em italiano." (...)

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José Saramago e Azio Corghi




4 de Janeiro de 1995 - "Cadernos de Lanzarote III"

"A cadela está novamente em casa. Não tornou por seu pé, porque, mesmo que quisesse, não saberia dar com o caminho, a primeira vez trouxe-a o acaso. Foi encontrada por Pilar e Javier, perto daqui, no meio da estrada. (...) Já lhe demos nome - passou a chamar-se Greta"

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"Pura leitura" de Pilar del Río sobre a obra "Autobiografia" de José Luís Peixoto

Publicado no blog de José Luís Peixoto
Pode ser aqui recuperado 
Capa da obra "Autobiografia" da Quetzal

"Com o ambicioso pretexto de escrever sobre outro autor, 
José Luís Peixoto entras pelos infernos da criação literária" 
Pilar del Río




4 de Janeiro de 1994 - "Cadernos de Lanzarote II"

"Escreve-me António de Macedo, em nome da sua produtora de filmes, a Cinequanon, para saber se estou interessado em escrever o argumento de um audiovisual (...) sobre os vinte anos do 25 de Abril. (...) Tirando o «renome», o que isto quer dizer é que não me deixam respirar. Aceito? Não Aceito?" (...)

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sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

3 de Janeiro de 1996 - "Cadernos de Lanzarote IV"

"O último número da revista norte-americana The New Yorker publica uma crítica de George Steiner a um livro, publicado por Carcanet Press, sobre o centenário de Pessoa. Aí se diz, a rematar: «Os editores incluíram duas entrevistas imaginárias póstumas, mas faltou-lhes o melhor nesta matéria. O Ano da Morte de Ricardo Reis, de José Saramago, que foi traduzido em 1991 por Giovanni Pontiero, é um dos grandes romances das letras europeias recentes. Fala do regresso de Ricardo Reis, vindo do Brasil, à pátria, fala do Fascismo em Lisboa, fala do encontro entre Reis e o seu falecido criador. Acerca de Pessoa e das suas contraditórias sombras, nada foi escrito de mais perceptivo.» (...)

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Giovanni Pontiero tradutor de José Saramago



3 de Janeiro de 1995 - "Cadernos de Lanzarote III"

"Não tenho culpa de que o Evangelho volte tantas vezes a estas páginas. Quem o traz aqui são os leitores, os que gostaram e os que detestaram, aqueles que foram tocados no coração e aqueles a quem se lhes revolveu a bílis. Esta carta veio de Israel e assinam-na Martha e Yakov Amir." (...)

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3 de Janeiro de 1994 - "Cadernos de Lanzarote II"

"Zeferino Coelho regressou hoje a Lisboa. Enquanto cá esteve leu tudo quanto tenho escrito nos últimos tempos: estes Cadernos, o capítulo do Ensaio, as notas para as Tentações. Propôs-me levar já os Cadernos, para publicar em Abril um primeiro volume." (...)
"Agora, por exemplo, chegaram-me de Itália, de Massimo Rizzante, colaborador da revista L'Atelier du Roman, de Paris, as perguntas da entrevista que lhes prometi. Não se afastam do habitual (a questão do romance histórico, a questão das personagens, a questão do narrador...), mas são nada menos que dezasseis, e todas a exigir resposta desenvolvida: aliás muito simpaticamente, informam-me de que tenho quinze páginas da revista à minha disposição..." (...)

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Capa da edição de Novembro 1993 com artigo de Michèle Gendreau-Massaloux 
sobre a obra Evangelho segundo Jesus Cristo

"josé saramago: um humanista por acaso escritor" documentário


Pode ser recuperado aqui
via YouTube em https://www.youtube.com/watch?v=0VRPnAAu8jo&t=914s

"filme-homenagem que busca olhar o mundo pelas lentes desassossegadas de josé saramago. documentário que revive o redemoinho de sensações, palavras e lembranças deixadas em quem o sentiu por perto. um humanista, que usou os microfones de um escritor, para gritar sobre o nosso mundo."

"Saramago, Portugal y España" por Alberto Matarán no Granada Hoy

"Saramago, Portugal y España" por Alberto Matarán no Granada Hoy
https://www.granadahoy.com/opinion/articulos/Saramago-Portugal-Espana_0_1424557604.html

"Las ideas de Saramago podrían consolidar una necesaria alianza entre todos los pueblos ibéricos"

"Este 2020 se cumplen 10 años de la muerte del Premio Nobel de literatura José Saramago. Seguramente es la persona que mejor ha representado los vínculos que nos unen con Portugal, que son muchos a pesar de que las oligarquías de uno y otro lado siempre han tratado de que nos demos la espalda.

Nuestro país tiene una enorme deuda con este escritor que nos eligió como su hogar cuando decidió alejarse de los ataques del extremismo ultracatólico portugués que quiso lapidarlo por escribir El Evangelio según Jesucristo, una de sus obras maestras, por cierto. En el décimo aniversario de su fallecimiento estamos ante una excelente oportunidad para saldar una parte de esta deuda recordando la obra y la figura de Saramago. Con la energía que siempre ha tenido su mujer, la castrileña Pilar del Río, no debería ser difícil sumar a nuestro país a las actividades de la fundación que lleva su nombre. Lanzarote, donde la pareja ibérica fijó su residencia, sería un territorio clave para este propósito, y Granada, de donde procede la familia de Pilar, podría ser también otro lugar de referencia aprovechando la potencia cultural de nuestra provincia y de nuestra universidad.

Además, ahora que por fin parece que tendremos gobiernos hermanos en los dos estados, las ideas de Saramago podrían consolidar una necesaria alianza entre todos los pueblos ibéricos y por qué no, también acercarnos a Latinoamérica tal y como representa la utopía del libro La balsa de Piedra. Una federación de los pueblos del sur nos permitirá atravesar con nuestras balsas las tormentas creadas por la globalización y los partidarios del odio.

Y es que Saramago nunca se olvidó de su origen y era constante su identificación con aquellas personas cuya existencia estaba estrechamente vinculada con la tierra. Tanto en su obra como en sus opiniones, demostraba un gran compromiso con el mundo y con los pueblos. En estos tiempos de desigualdad insoportable, de emergencia climática y de colapso civilizatorio, las palabras de Saramago resuenan cada día con más fuerza. Hoy quiero recordar esta frase de los Cuadernos de Lanzarote: "Somos la memoria que tenemos y la responsabilidad que asumimos. Sin memoria no existimos y sin responsabilidad quizá no merezcamos existir". Les propongo utilizar esta frase como propósito de año nuevo, yo lo pienso hacer. Y si me permiten recomendarles una lectura para este año que entra, les aconsejaría Memorial del convento, a mi entender el mejor libro de Saramago y una de las más bonitas historias de amor que se han escrito nunca."

quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

2 de Janeiro de 1997 - "Cadernos de Lanzarote V"

"É corrente ouvir dizer que são tantas as leituras de um livro quantos tiverem sido os seus leitores (...), o que quererá dizer, se não interpreto mal, que o autor mais afortunado será aquele que, graças a uns quantos leitores atentos que lhe vão comunicando as suas impressões de leitura, está continuamente em processo de aprendizagem sobre a própria obra." (...)

Sobre a carta enviada por Barbara Probst-Solomon, escritora norte-americana a propósito do Evangelho segundo Jesus Cristo.
Pilar del Río recordou a sua morte no passado dia 2.9.2019


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2 de Janeiro de 1996 - Cadernos de Lanzarote IV

"De El Hierro, a ilha mais pequena e mais ocidental do arquipélago, chega-me a carta de um professor primário que assina, simplesmente, António. É uma jóia para a caverna de um Ali-Babá que nunca roubou nada a ninguém, mas a quem tem sido dado, às mãos cheias, o que no mundo existe de mais precioso: palavras boas. 
Eis a carta" (...)

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quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

1 de Janeiro de 1996 - "Cadernos de Lanzarote IV"

(...) "É o Pico de la Tejada, que de pico só tem nome, porventura resto de épocas mais altaneiras. (...) Quando regresso a casa olho para trás. Ali estão os algibes, tranquilos como uma ruína, indiferentes ao deserto em que os abandonaram. Vendo-os assim, guardando o que lhes foi confiado, compreendi a razão por que a estas cisternas chamamos também de arcas de água. Ao dizer arca, ao dizer água, estamos a dizer tesouro."

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"A janela de Saramago” 
Fotografia de João Francisco Vilhena



Noiserv & José Saramago - "As Intermitências da Morte" (José e Pilar OST)

Noiserv - "As Intermitências da Morte"
Música do filme "José e Pilar"

Via YouTube aqui