Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

quarta-feira, 24 de junho de 2015

Post intitulado "Laicismo" no livro/blog "O Caderno 2" (4 de Junho de 2009)

No dia em que o escritor Manuel Frias Martins, foi galardoado com o "Grande Prémio de Ensaio Eduardo Prado Coelho 2014", pela obra «A Espiritualidade Clandestina de José Saramago», trago aqui a entrevista de Mário Crespo (SicNotícias) ao Padre Dr. Joaquim Carreira das Neves e José Saramago, a propósito do lançamento da obra "Caim", e também, o post "Laicismo" de 4 de Junho de 2009.

(Pode ser visualizado aqui via YouTube,


O post, pode ser consultado e lido aqui,
em http://caderno.josesaramago.org/44956.html

"Laicismo"
"Anda acesa a questão do laicismo, a meu ver em termos não muito claros, porquanto parece querer ignorar-se a questão fundamental que subjaz ao debate: crer ou não crer na existência de um deus que, não só terá criado o universo e portanto a espécie humana, como virá a ser, no fim dos tempos, o juiz dos nossos cometimentos na terra, premiando as boas acções com a admissão num paraíso em que os eleitos contemplarão a face do Senhor durante toda a eternidade, enquanto, também por toda a eternidade, os culpados de acções más arderão no inextinguível fogo do inferno. Esse juízo final não será fácil, nem para deus nem para os que vão ter de prestar contas, pois não se conhece um único caso de alguém que, em vida, tenha cometido exclusivamente boas acções ou más acções. O próprio do homem é a inconstância nos propósitos e nos actos, sempre a contradizerem-se de uma hora para a outra. No meio de tudo isto, o laicismo aparece-me mais como uma posição política determinada mas prudente que como a emanação de uma convicção profunda da não existência de deus e portanto da impertinência lógica das instituições e dos instrumentos que pretendem impor o contrário à consciência da gente. Discute-se o laicismo porque, no fundo, se teme discutir o ateísmo. O interessante do caso, porém, é que a Igreja Católica, na sua velha tradição de fazer o mal e a caramunha, anda por aí a queixar-se de ser vítima de um suposto laicismo “agressivo”, nova categoria que lhe permite insurgir-se contra o todo fingindo atacar apenas a parte. A duplicidade sempre foi inseparável das tácticas e das estratégias diplomáticas e doutrinais da cúria romana.

Seria de agradecer que a Igreja Católica Apostólica Romana deixasse de meter-se naquilo que não lhe diz respeito, isto é, a vida civil e a vida privada das pessoas. Não devemos, porém, surpreender-nos. À Igreja Católica importa pouco ou nada o destino das almas, o seu objectivo sempre foi controlar os corpos, e o laicismo é a primeira porta por onde começam a escapar-lhe esses corpos, e de caminho os espíritos, já que uns não vão sem os outros aonde quer que seja. A questão do laicismo não passa, portanto, de uma primeira escaramuça. A autêntica confrontação chegará quando finalmente se opuserem crença e descrença, indo esta à luta com o seu verdadeiro nome: ateísmo. O mais são jogos de palavras." (4 de Junho de 2009)

"Grande Prémio de Ensaio Eduardo Prado Coelho 2014" atribuído a Manuel Frias Martins pela obra «A Espiritualidade Clandestina de José Saramago»

O detalhe da notícia pode ser consultada e lida, aqui
em http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?id_news=779004

"«Há mais mistérios entre Saramago e Deus do que possamos prever». 
A frase é da investigadora brasileira Selma Ferraz, que José Tolentino Mendonça citou, em Fevereiro último, na crítica que assinou no semanário Expresso ao livro «A Espiritualidade Clandestina de José Saramago». A obra, vista pelo crítico como um «interessantíssimo ensaio», acaba de valer ao autor, Manuel Frias Martins, o Grande Prémio de Ensaio Eduardo Prado Coelho 2014."

(Montagem cénica, da obra de Manual Frias Martins, 
conjuntamente, com o "Evangelho Segundo Jesus Cristo" e "Caim", 
obras abordando a temática de Deus e religão)  


Nesta sua sexta edição, o galardão, promovido em parceria pela Associação Portuguesa de Escritores e a Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, distinguiu por unanimidade a obra escrita pelo crítico, professor universitário e ensaísta português.

O livro, editado pela Fundação José Saramago, choca com o assumido ateísmo de Saramago, conforme se percebe com uma rápida leitura do prólogo: «(…) as obras de Saramago se dirigem inequivocamente aos interesses e às necessidades práticas dos leitores (…) apontando ao mesmo tempo para a espiritualidade como expressão intensa da verdade.»  

O Prémio de Ensaio Eduardo Prado Coelho foi instituído em 2010 e distingue, anualmente, uma obra de ensaio literário, publicada em livro, com o valor monetário de 7.500 euros.

«Trata-se de uma homenagem que pretende perpetuar o grande ensaísta Eduardo Prado Coelho, falecido em 2007, que doou ao nosso município o seu espólio bibliográfico de 12.500 títulos, disponível para consulta na Biblioteca Municipal Camilo Castelo Branco», explica a propósito o presidente da Câmara Municipal, Paulo Cunha.

O Grande Prémio de Ensaio premiou em 2014, José Gil; em 2013, Rosa Maria Martelo; em 2012, João Barrento; em 2011, Manuel Gusmão e em 2010, Vítor Aguiar. A data da cerimónia de entrega do prémio será divulgada oportunamente.

Sinopse de «A Espiritualidade Clandestina de José Saramago»
Saramago pertence àquele grupo de escritores que parecem ter lido em toda a parte ou vivido em todo o lado, mapeando o humano por sinais identificáveis por todos ao mesmo tempo e decifrados por cada um à sua maneira. Tanto as suas construções ficcionais das atmosferas judaica e cristã como as observações subsidiárias que encontramos dispersas por entrevistas e artigos refletem uma amplitude de referências culturais onde se abriga um extraordinário ecletismo filosófico e religioso ou, dito de outra maneira, um conhecimento amplo do fundo cultural e religioso da humanidade, o qual é não raras vezes encarado como desafio à razão e à imaginação do próprio escritor. Possuidor de um espírito inquieto quando à humana condição e de um coração ávido de justiça, o homem José Saramago é uma espécie de abrigo intelectual de um escritor que mistura criativamente os inúmeros conseguimentos do pensamento humano independentemente da sua proveniência histórica ou geográfica.