Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

domingo, 21 de fevereiro de 2016

Sobre o livro de Bernard Connoly e os ventos políticos que pairavam pela Europa de 1995 - "Cadernos de Lanzarote Diário III" (5/9/1995)

A referida edição encontra-se à venda e disponível, aqui

"The Brussels Commission has just suspended its senior economist, Bernard Connolly, for writing a book savaging the prospects for a common currency. 
There are many who now believe he should be lauded as a prophet." 
Observer, Editorial, 1 October 1995

"Mr. Connolly's longstanding proposition that the foisting of a common currency upon so many disparate nations would end in ruin is getting a much wider hearing..." 
New York Times, 17 November 2011


5 de Setembro (de 1995)

"Dentro de poucos dias será publicado em Inglaterra um livro explosivamente polémico, se a fazenda de dentro vier a corresponder à amostra de fora, isto é, ao título anunciado: O Carcomido Coração da Europa: a Guerra Suja pela Europa Monetária. O autor chama-se Bernard Connolly e faz parte do certamente qualificado grupo de altos funcionários que estão encarregados de gerir a política monetária da União Europeia. Presume-se, portanto, que seja alguém que sabe o que diz. E que diz ele? Diz, por exemplo, que o Sistema Monetário Europeu é uma «monstruosidade económica» e a união monetária um «perigoso logro». E vai mais longe: prenuncia que a união monetária levará a uma batalha aberta entre a França e a Alemanha para conseguir a hegemonia na União Europeia. A Comissão não gostou de vaticínios e opiniões tão contrários aos seus gostos e entregou o caso ao Comité de Disciplina. Ora, independentemente da substância e do mérito dos fundamentos objectivos que assistam ao funcionário rebelde (aliás, seguidor declarado de Margaret Thatcher) para ter formulado tão sombrios prognósticos (chega mesmo ao ponto de dizer que tais conflitos e contradições poderão vir a resultar numa guerra), aquilo que, a meu ver, deveria merecer toda a nossa atenção é a emergência cada vez mais exigente da questão em que toda a gente pensa, mas de que pouquíssimos têm a coragem de falar sem disfarces: a hegemonia sobre a Europa. Que a Alemanha se tenha tornado, por assim dizer, em candidato «natural» a essa hegemonia, é algo tão flagrante que parece já ter adquirido um estatuto de fatalidade inelutável; que a França comece a reagir desesperadamente à perspectiva de continuar, no quadro europeu, a ser o que é hoje, apenas o maior dos menores, e ver agravada a sua dependência política - tudo isto é mais um episódio do velho jogo chamado «quem-manda-na-Europa», a que, ingenuamente, alguns políticos «integracionistas» pensaram poder mudar as regras. E se, como dizia o Eduardo Guerra Carneiro dos antigos tempos, «isto anda tudo ligado», é caso para nos perguntarmos se as bombas atómicas que Paris vai fazer explodir no Pacífico não se destinam, afinal, a ser ouvidas em Bona." (...)

in, "Cadernos de Lanzarote Diário III"
Caminho, páginas 149 e 150 (5/9/1995)



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