Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Luis pastor "Nesta Esquina do Tempo" - poema "Digo Pedra"


Luis Pastor canta poemas de José Saramago
Álbum "Nesta Esquina do Tempo"
Musica "Digo Pedra"

«Que seja eu o autor das poesias aqui interpretadas,
em português e também em castelhano, é apenas
uma feliz coincidência. O que é importante é a
música. E a voz, essa inconfundível voz de Luis
Pastor, áspera e ao mesmo tempo suave, tal como
as vozes dos grandes trovadores do século passado.
Oiçamos»
José Saramago

(alguma palavras sobre Luis Pastor)

Nesta esquina do tempo pode explicar-se de uma
forma simples: Luís Pastor compõe a música e
canta os poemas de José Saramago, Prémio Nobel
de Literatura em 1998. Mas as obras excepcionais
costumam habitar em mundos modestos e Nesta
esquina do tempo é uma obra maior, que também
nasceu de uma maneira natural, espontânea
e sincera. Pilar del Rio, esposa de Saramago e
tradutora da sua obra para espanhol referiu: «Um
dia, não há muito tempo, José Saramago e Luís
Pastor encontraram-se. Mais tarde partilharam
tribuna para dizer com força que não queriam
guerras canalhas, que as únicas ofensivas morais e
necessárias eram as que deveriam combater a fome
e a falta de cultura. Luís Pastor foi ousado e deu o
passo seguinte quando, dirigindo- se a Saramago,
disse-lhe que ia escrever a música para os seus
poemas e, mais ainda, que ia cantar em português.
Saramago achou piada, riu e disse: “oxalá”. De certo,
pensou que a loucura dos músicos é quase tão
grande como a dos sábios. Esqueceu o assunto e
começou a escrever As intermitências da Morte.
Luís Pastor continua a história de Nesta esquina do
tempo «Surgiu de um encontro, por acaso» refere
o cantor. «Em Maio de 2005 viajei até Lanzarote
com Moncho Armendáriz para apresentar o
documentário Unidades Móviles. Tomámos um café
com José Saramago, que me ofereceu um livro das
Obras Completas de Poesia e eu disse-lhe meio a
sério, meio a brincar: – vou musicar os seus poemas.
No avião de regresso para Madrid, comecei a
trabalhar, e em casa ia cantando os poemas só
com a voz, sem instrumentos. Passados três dias
compus todas as músicas mas, por acidente, foram
apagadas do minidisc. Comecei de novo, com a
certeza de que não ia ter problemas. Depois passei
à harmonia e gravei umas maquetes, que José 
Saramago e Pilar del Rio ouviram em Outubro
de 2005. Só questionaram a minha pronúncia do
português. Tomei nota, comecei a estudar e fui
aprendendo ao ouvir Saramago a declamar os
seus próprios poemas, numas cassetes que tinha
gravado para mim. Foi fundamental gravar metade
do disco em Portugal, com a produção de João
Lucas e a ajuda de João Afonso».
«Estava predestinado a fazer este disco pela minha
paixão por Portugal, pela música e a língua», diz
Luís Pastor. «Em português, antes só tinha musicado
um poema de Fernando Pessoa, mas sempre
admirei e fui amigo de José “Zeca” Afonso e do seu
sobrinho João, do Fausto, de Sérgio Godinho... Ao
deparar-me com a obra de José Saramago senti
a musicalidade e a importância da temática. No
álbum há poemas de amor, alguns mais surrealistas,
outros sociais... São poemas grandes, belíssimos,
nunca banais». Pilar del Rio escreveu: «apesar dos
conselhos dos bem-pensantes, é como se José
Saramago e Luís Pastor gostassem de brincar.
Transgrediram as normas e a idade, cada um
acarretando os seus muitos e jovens anos de uma
vida entre poemas e canções, com a pele nua,
sentindo e desfrutando. Mais do que um disco é
um milagre».
Ninguém melhor do que Saramago para resumir
este feliz encontro da música e da palavra Nesta
esquina do tempo: «Que seja eu o autor das poesias
aqui interpretadas, em português e em espanhol,
é só uma feliz coincidência. O que mais importa é
a música. E a voz, essa inconfundível voz de Luís
Pastor, áspera e ao mesmo tempo suave, como o
foram as vozes dos grandes trovadores do século
passado. Ouçamo-lo.
O tempo cabe todo na duração de um disco»

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